Logo do Jovem Nerd
PodcastsNotíciasVídeos
South of Midnight costura empatia e resiliência em uma experiência marcante | Review
Games

South of Midnight costura empatia e resiliência em uma experiência marcante | Review

Jogo traz gameplay simples e repetitivo, mas com folclore, trilha e visuais autênticos

Jessica Pinheiro
Jessica Pinheiro
14.abr.25 às 17h06
Atualizado há 11 dias
South of Midnight costura empatia e resiliência em uma experiência marcante | Review
(Xbox Game Studios/Divulgação)

Poucas vezes na vida senti urgência em procurar sobre o processo de desenvolvimento de um jogo logo depois de zerá-lo, para destrinchar e me aprofundar em suas referências e mensagens, ou até mesmo para saber curiosidades de sua criação. South of Midnight, novo título do estúdio Compulsion Games (de We Happy Few) me trouxe essa vontade no instante em que o terminei.

A primeira parada foi o documentário sobre o jogo, disponível na página do Compulsion Games no YouTube. No vídeo, o diretor criativo David Sears expressa o desejo de criar uma “carta de amor ao Sul” dos Estados Unidos, e explica que South of Midnight é também “sobre aprender a ter empatia por pessoas que são diferentes de você”. E, então, tudo fez sentido, e a experiência com o game, de forma geral, se tornou ainda mais especial.

Fantasia inspirada na realidade

South of Midnight se passa na cidade e arredores de Prospero, próxima a Nova Orleans, Alabama e Louisiana — ou seja, situada na região sul dos Estados Unidos. A protagonista desta jornada é Hazel Flood, uma jovem que pratica corrida e que está para sair de casa com a mãe, Lacey, devido à tempestade que se aproxima.

Entretanto, a residência é levada pela correnteza quando o clima piora, logo após uma discussão entre as duas. E como Lacey ainda estava dentro da casa quando ocorreu o acidente, Hazel utiliza todo o fôlego que adquiriu ao praticar corrida atlética para tentar alcançar a mãe.

South of Midnight costura empatia e resiliência em uma experiência marcante | Review As animações de movimentos da Hazel parecem a de uma corredora de atletismo de verdade! (Xbox Game Studios/Reprodução)

Enquanto corre e salta obstáculos pelo caminho, Hazel percebe que consegue enxergar linhas, e que as mesmas guiam a protagonista pelo caminho certo. Então, após ser ajudada pela avó paterna Bunny, Hazel encontra um par de agulhas de crochê enormes, e as usa para desemaranhar o Estigma que a cerca.

Estigma é essencialmente a manifestação física do trauma que as pessoas carregam, e Hazel, que a partir desse momento se torna uma Tecelã, pode manipular as Linhas da Grande Tapeçaria (basicamente o tecido da realidade), seja para canalizar e conjurar feitiços com os fusos, ou para ver ecos do passado com a roca — todos instrumentos de fiação e torção de fibras.

Os Estigmas também formam espinheiros que obstruem ou destroem passagens para dificultar a progressão do jogador. Por isso Hazel precisa saltar, planar, agarrar-se a postes para alcançar locais distantes, correr em paredes e até mesmo arremessar Crouton, seu “bichinho de pelúcia” feito de remendos, em locais que ela não consegue entrar. Todos esses elementos de exploração fazem South of Midnight se parecer mais com um jogo de plataformas às vezes, mas é a mitologia por trás das ferramentas que Hazel utiliza, que torna a jogabilidade algo único.

South of Midnight costura empatia e resiliência em uma experiência marcante | Review O Bagre será seu principal guia pelas buscas em Prospero. (Xbox Game Studios/Reprodução)

A exemplo disso está a corrida nas paredes, uma mecânica de exploração bastante comum em jogos de aventura hoje em dia, certo? Porém, Hazel consegue executar essa ação com suas agulhas de crochê apenas em superfícies formadas com técnicas artesanais de quilting e patchwork, aquelas colchas de retalhos que muitas vezes costuram tecidos com padrões e texturas diferentes em si, formando um mosaico.

O quilting e o patchwork, por sua vez, estão associados às comunidades afro-estadunidenses, com os primeiros registros de peças artesanais nesse estilo datadas no período de colonização, principalmente em áreas rurais. Isso sem falar na importância delas durante a Guerra Civil, quando as colchas de retalhos foram usadas para enviar mensagens codificadas com o objetivo de ajudar escravos a escaparem da região norte.

Atualmente, as técnicas servem para preservar tradições vindas da África, além de construir uma rede de apoio entre as mulheres. E isso é apenas um exemplo de como South of Midnight mergulha nas raízes culturais e históricas da comunidade afro-estadunidense do sul do país, para aprimorar todo o conceito por trás de suas mecânicas. Isso também se aplica a personagens do jogo, com muitos deles sendo adaptados do folclore regional.

South of Midnight costura empatia e resiliência em uma experiência marcante | Review Molly Abraço-Apertado tem um visual aterrorizante, mas memorável! (Xbox Game Studios/Reprodução)

O Rougarou, por exemplo, é uma criatura lendária nas comunidades da diáspora Cajun; enquanto Molly Abraço-Apertado vem de contos populares do sudeste do Alabama. Já as Assombrações, os inimigos que Hazel enfrenta durante boa parte do jogo, surgiram na cultura Gullah, e são basicamente espíritos malévolos, ou fantasmas, que ferem pessoas. Por sinal, é importante ressaltar que o povo Gullah é descendente de africanos escravizados que foram trazidos para a região sudeste dos Estados Unidos no final do século XVI. Eles possuem dialeto e cultura própria.

Nem todo bordado forma flores

As nuances, a pesquisa e consultoria, os conceitos, as referências… South of Midnight brilha fortemente em cada um desses aspectos, trazendo uma essência única ao jogo e enriquecendo não apenas a si mesmo, como também os jogadores.

Entretanto, uma das maiores ressalvas com o game é que ele se perde bastante em uma fórmula repetitiva de progressão. Ao longo de quatorze capítulos, Hazel embarca em uma jornada incrível para encontrar sua mãe, enquanto ajuda diversos personagens e criaturas míticas — e todas elas estão, de alguma forma, conectadas à cidade de Prospero ou à história da protagonista. Os arcos relacionados a esses personagens, locais e/ou criaturas míticas são chamados de Tramas.

South of Midnight costura empatia e resiliência em uma experiência marcante | Review Quando os inimigos brilham em amarelo, é preciso se afastar, pois eles ficam temporariamente invencíveis. (Xbox Game Studios/Reprodução)

Para desemaranhar as Tramas — o que significa que você vai entender toda a verdade e, de tabela, progredir na jornada —, Hazel precisa eliminar as Assombrações em sequências de batalhas, e só então desfazer os Nós que concentram os Estigmas. Após isso, o jogador assiste a uma das memórias dolorosas dessas figuras/lugares, e a protagonista literalmente as armazena em uma garrafa mágica.

Este ciclo se repete pelo menos quatro vezes quando é chegada a hora de desemaranhar as Tramas; sem contar as lutas comuns, quando não é preciso coletar nenhuma memória. Isso pode tornar South of Midnight uma experiência tediosa, caso você busque um gameplay diversificado com mecânicas inovadoras, que constantemente instigam o jogador a compreender e experimentar um estilo de jogo diferente.

Pessoalmente, não foi algo que me afastou drasticamente do game, pois a narrativa, os personagens e toda a mitologia desse universo me fascinaram em um nível altíssimo, então me mantive estimulada a jogar por conta desses elementos. O gameplay em si, porém, infelizmente fica devendo.

South of Midnight costura empatia e resiliência em uma experiência marcante | Review Tom Dois-Dedos traz um dos melhores segmentos musicais do jogo. (Xbox Game Studios/Reprodução)

E, para completar, há outro aspecto irritante na jogabilidade: paredes invisíveis que limitam as buscas nos cenários. É um detalhe que pode desanimar os jogadores que buscam mais liberdade quando estão explorando. Particularmente, passei por momentos de raiva nos segmentos em que procurava por colecionáveis, especialmente os Felpos, que são pontos para distribuir na árvore de habilidades, de modo a deixar Hazel mais poderosa.

Por falar em colecionáveis, South of Midnight possui diversos documentos espalhados pelos cenários, que entregam ainda mais contexto e explicam detalhes da história de maneira geral.

Por último, mas não menos importante, South of Midnight entrega uma trilha sonora marcante. Assinada por Olivier Deriviere (de A Plague Tale e Streets of Rage 4), as faixas dinâmicas do game deixam o ritmo de progressão mais divertido e emocionante conforme você avança nas investigações em Prospero, e as músicas cantadas vão ganhando mais vozes e letras, crescendo de maneira brilhante.

Toda a trilha sonora também mescla os principais gêneros que têm origem na cultura negra dos Estados Unidos, como o blues, jazz, R&B e gospel. O blues, em específico, é o que mais se sobressai, corroborando completamente com o surgimento do estilo no século XIX, nas plantações de algodão do Sul do país.

Pepetitivo, mas poderoso

Embora tenha um ritmo instável devido à repetitividade de seu gameplay, e ainda entregue mecânicas nada inovadoras, South of Midnight transborda em essência e cultura, com uma estrutura de mundo memorável e gráficos que simulam animação stop-motion — algo que o Xbox Game Studios chama de “estilo visual artesanal”.

Além disso, o game traz uma narrativa tocante, trilha sonora rica inspirada na complexa história do Sul, e referências e inspirações no folclore e na cultura de povos que estão fisicamente (e historicamente) tão distantes de nós. São muitos os detalhes e aspectos que fazem South of Midnight se diferenciar de diversos títulos da atualidade, e o resultado é uma experiência especial e marcante. É certamente um daqueles games que, caso você tenha a oportunidade de jogar, não deve deixar passar de forma alguma.

South of Midnight está disponível para Xbox Series X|S e PC (via Steam e Microsoft Store). Os assinantes de Xbox Game Pass podem jogá-lo tanto no console quanto no PC. A análise do NerdBunker foi feita por meio de uma cópia antecipada cedida pelo Xbox Game Studios. Siga de olho e aproveite para entrar em nosso grupo do Telegram e mais - acesse e confira.

Encontrou algum erro neste conteúdo?

Envie seu comentário

Veja mais

Utilizamos cookies e tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência em nossas plataformas, personalizar publicidade e recomendar conteúdo de seu interesse. Ao continuar navegando, você concorda com estas condições.
Para mais informações, consulte nossa Política de Privacidade.
Capa do podcast

Saiba mais