O lançamento de Vingadores: Ultimato levou muitos fãs a se questionarem sobre o futuro da Marvel, já que aquele parecia ser um ótimo ponto final para esse universo de heróis no cinema. Assim, um desafio silencioso foi estabelecido para os próximos filmes reconquistassem a atenção do público, tarefa que Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis cumpriu com louvor em uma aventura épica e cheia de emoção.
O filme acompanha Shang-Chi (Simu Liu), jovem que vive uma vida badalada nos Estados Unidos após fugir do pai Wenwu (Tony Leung), líder da terrível organização criminosa Dez Anéis. Quando o passado volta para atormentá-lo, ele precisa confrontar o passado e unir forças à irmã Xu Xialing (Meng'er Zhang) e à amiga Katy (Awkwafina) para deter o malfeitor e salvar a mística cidade de Ta Lo.
Na lista de lançamentos do estúdio, Shang-Chi não foi a sequência direta do quarto filme dos Vingadores, posto ocupado por Homem-Aranha: Longe de Casa e Viúva Negra. Porém, esses foram longas focados em mostrar as consequências imediatas de Ultimato e visitar o passado de uma grande heroína, respectivamente. O recomeço só veio no filme de 2021, que não à toa é uma história de origem.
Para não cair a chamada “fórmula Marvel”, o diretor Destin Daniel Cretton, que escreveu o roteiro em parceria com Dave Callaham e Andrew Lanham, abandona cenários costumeiros como a castigada Nova York do MCU por uma bela floresta. Lá se desenrola uma belíssima batalha digna de grandes filmes de wire-fu (subgênero em que as lutas de Kung Fu utilizam cabos para extrapolar as leis da física) som de uma trilha sonora quase onírica.
O impacto é imediato, proporcionando um deslumbramento comparável à primeira visão de Asgard em Thor (2011), do espaço em Guardiões da Galáxia (2014) ou de Wakanda em Pantera Negra (2019). É apenas após essa introdução que o filme retorna aos EUA do presente para mostrar Shang-Chi antes que o passado volte a assombrar. Entre perrengues e baladas, o cotidiano do jovem faz um enorme contraste com as sequências iniciais. O fantástico dá lugar ao real da forma mais barulhenta, colorida e até violenta, já que agora os combates valem a vida do herói e aqueles ao seu redor.
A partir daí, Destin Daniel Cretton propõe uma experiência rica ao misturar o fantasioso passado distante de um povo, a tragédia de uma família e a incerteza sobre o futuro. Tudo isso para dar ao momento presente uma sensação de urgência e completude poucas vezes vistas em aventuras solo.
Para viver essa história, a produção contou com um trabalho inspirado da parte de todo o elenco principal. Com a responsabilidade de ser um novo herói em um universo povoado por eles, Simu Liu confere à Shang-Chi uma versatilidade ao divertir nos momentos de ação e comover nos emotivos. Não à toa, todas as relações que o personagem constrói na produção parecem tão verdadeiras, como a linda e cativante amizade com Katy — que conta com todo o carisma de Awkwafina para ganhar uma jornada própria capaz de tocar a audiência de uma forma única.
Tony Leung faz de seu Wenwu um dos vilões mais encantadores e cruéis do MCU. Ele coloca tanta verdade na forma como o personagem se comunica — muitas vezes de uma forma gestual — que se torna fácil se pegar torcendo por ele. Em porções menores graças ao reduzido tempo em tela, Meng'er Zhang também comove ao construir uma Xu Xialing dividida entre a mágoa por uma vida sendo deixada de lado e o esforço para acreditar no melhor e tentar reconstruir pontes.
Com uma história potente e um elenco afiado, Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis ainda teve o trunfo de contar com cenas de ação de primeira. Considerando que o apelido do protagonista é “Mestre do Kung Fu”, é natural que uma expectativa quanto a esse quesito fosse criada em torno do filme, e ele não decepciona. Seja no submundo de clubes da luta em Macau ou em um campo de guerra digno de fábulas, os embates convencem e empolgam. Não é exagero dizer que a famosa luta nos andaimes já nasceu clássica.
É claro que se tratando de um produto da Disney, o filme conta sim com sua cota de problemas. Muitos deles estão ligados a recursos manjados da “fórmula Marvel”, como convenções de roteiro e piadas fora de hora. Essas questões não chegam a comprometer a experiência, mas é um pouco decepcionante que o estúdio ainda não esteja pronto para abrir mão de certos artifícios.
No fim das contas, Shang-Chi e a Lenda dos Dez Anéis se mostrou uma ótima aventura solo. Com uma história sólida e cheia de carisma, o personagem fincou os dois pés no MCU antes mesmo de suas duas cenas pós-créditos. Com uma construção de mundo muito rica, o personagem não só manteve o universo da Marvel vivo, como o expandiu um pouco mais.
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