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Série de Fallout celebra a experiência de desbravar os games | Crítica
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Série de Fallout celebra a experiência de desbravar os games | Crítica

Seriado do cocriador de Westworld acerta ao optar por história original que reflete a jornada do jogador

Arthur Eloi
Arthur Eloi
12.abr.24 às 19h05
Atualizado há cerca de 1 ano
Série de Fallout celebra a experiência de desbravar os games | Crítica
Fallout (2024)/Amazon Prime Video/Divulgação

Com a tendência de adaptações de games ganhando força, os criadores passam a enfrentar desafios únicos para transpor jogos para outros meios. Por um lado, projetos que desviam muito do material-base podem frustrar uma grande parcela dos fãs, como é o caso de Halo. por outro, nem tudo pode ser adaptado com exatidão, quadro-a-quadro, como The Last of Us fez na HBO.

Jogos mais longos, ou que equilibram a narrativa dos desenvolvedores com as histórias criadas pelos jogadores, precisam de soluções especiais na hora de mudarem de meio, para não perderem o brilho ou ficarem insatisfatórios, sem saber se devem agradar a novatos ou veteranos. Até mesmo nomes como Hideo Kojima (Metal Gear Solid, Death Stranding) já assumiram que não é nada fácil a tarefa de “encaixar” jogatinas de 50 horas, ou até de centenas de horas e além, nas curtas durações de filmes e séries de TV.

Na série de Fallout, Jonathan Nolan achou uma boa alternativa para a questão: complementar, em vez de adaptar. O cocriador de Westworld e sua equipe buscam se inserir no universo já existente da franquia, o que resulta em um seriado autêntico à experiência de desbravar o mundo pós-apocalíptico dos jogos, mas que também prende o espectador pela trama, pelos personagens, pela ação e pelas reviravoltas que se esperam de uma boa série de TV.

Mundo em Chamas

Série de Fallout replica várias das sensações do jogo, como ver o mundo devastado pela primeira vez ao sair da Vault [Créditos: Prime Video/Divulgação]
A série está inserida no mesmo mundo que os jogos, mas ganha liberdade criativa ao se passar alguns anos depois de todos os games, com ambientação e trama inéditas. O texto apresenta Lucy (Ella Purnell), habitante da Vault 33, um bunker subterrâneo que proporciona sobrevivência e conforto mesmo após uma guerra nuclear destruir todo o mundo da superfície. A jovem, porém, se vê levada ao desconhecido mundo radioativo quando seu pai, Henry (Kyle MacLachlan), é sequestrado por um misterioso grupo de invasores, liderados pela enigmática Moldaver (Sarita Choudhury).

Se a premissa soa simples, essa parece ser a ideia: criar algo que evoque clichês aventurescos, mas que seja funcional o bastante para se passar pela trama de um game inédito. Há um chamado para a aventura, um vilão com motivações desconhecidas, e todo um novo mundo diferente para explorar. É a dramatização da experiência de desbravar um RPG pela primeira vez. Assim como o filme de Dungeons & Dragons, Fallout celebra as histórias que surgem a partir das nossas interações com as mecânicas dos jogos e com vastos mundos abertos virtuais.

Lucy é um reflexo disso. Logo no início, a jovem apresenta sua “build”, descrevendo habilidades de combate, agilidade e manuseio de armas de fogo, mas evidencia também uma atitude otimista que é incompatível com a violenta superfície devastada, conhecida como Os Ermos. A jornada que a série propõe é a da construção de uma sobrevivente, levando a sério a ideia de “ganhar experiência”. Afinal, o que começa como uma simples missão logo se evidencia como uma enorme conspiração, envolvendo outros personagens, facções que atuam nos Ermos e até mesmo o passado antes das bombas nucleares caírem.

Lucy representa muito bem uma protagonista de videogame: habilidosa, mas sem tato para lidar com o mundo fantástico ao seu redor [Créditos: Fallout/Prime Video/Divulgação]
O maior acerto de Fallout é a combinação orgânica entre a experiência dos games e a estrutura narrativa televisiva. Para honrar a forma que interagimos com esses RPGs, a série avança de forma irregular ao constantemente colocar pessoas e missões paralelas no caminho da missão principal de Lucy, levando-a para desbravar diversas cidades, interagir com todo tipo de figura do mundo pós-apocalíptico, e se meter em enrascadas bizarras.

Ao mesmo tempo, o programa encontra espaço para desenvolver outros três protagonistas — Maximus (Aaron Moten), um soldado novato da Irmandade do Aço; Norm (Moises Arias), o irmão de Lucy que investiga mistérios na Vault 33; e O Necrótico (Walton Goggins), caçador de recompensas zumbificado que inferniza a protagonista —, além de aprofundar conflitos políticos desse mundo, e até explorar como era a vida antes da destruição nuclear.

Ótimo elenco é uma das forças por trás de Fallout [Créditos: Prime Video/Divulgação]
Depois de brilhar em Yellowjackets, Ella Purnell faz com que a inocência de Lucy funcione através da sinceridade, com pitadas de bom humor. Mas quem rouba a cena mesmo é Walton Goggins como o Necrótico. O ator já havia demonstrado talento para faroestes, tanto em Os Oito Odiados quanto como o memorável vilão de Justified, mas Fallout lhe dá a oportunidade de viver um cowboy impiedoso, sarcástico e charmoso (apesar da cara deformada). Aaron Moten ganha força ao ritmo em que a temporada avança, com um Maximus que brilha quando se mostra humano e vulnerável, mas muito corajoso. Do grupo, o Norm de Moises Arias é o menos convincente, mas até ele é passável por ser sustentado por um dos arcos mais intrigantes da temporada.

O que poderia facilmente acabar sendo um seriado estufado resulta, na verdade, em uma obra que atinge perfeitamente o que faz os jogos serem tão amados: o balanço entre sátira ácida, humor macabro, intrigas empolgantes, e ambientação apaixonante.

A Guerra Nunca Muda

Série de Fallout cria obra digna dos games, sem medo de confundir novatos — seja isso bom ou ruim [Créditos: Prime Video/Divulgação]
É curioso pensar como Fallout se sairá no mundo real. A série não parece realmente se preocupar em explicar o que é a franquia aos novatos. Isso é uma faca de dois gumes, já que demonstra enorme confiança, enquanto corre o risco de confundir que não tem a mesma base dos fãs mais apaixonados.

Ainda que tenha muito a ser elogiado em termos de estética, escrita e atuação, o seriado frequentemente deixa a desejar na direção. É curioso como um mundo tão original e intrigante é conduzido de forma tão desinteressada, sem vontade alguma de realmente fazer algo único com os ótimos cenários e figurinos que tem, recorrendo a fotografia pouco inspirada e ao uso excessivo de câmera lenta e efeitos especiais de qualidade duvidosa. Ainda que seja válido apontar tais características, não parece justo desmerecer o programa por conta disso, visto que toda a abordagem da produção é criar algo para ficar ao lado dos jogos — não acima, e nem abaixo.

Direção insossa não faz nenhum favor aos excelentes figurinos e cenários, mas também não diminui as várias qualidades da série [Créditos: Fallout/Prime Video/Divulgação]
Em entrevistas antes do lançamento, os showrunners Geneva Robertson-Dworet e Graham Wagner falaram que desenvolveram a série como se fosse um quinto jogo da franquia. Agora, fica evidente que isso não é da boca para fora. O seriado realmente se parece com o game, ao mesmo tempo que contribui com uma história inédita e com revelações importantes para o universo da franquia.

Na época de Westworld, os criadores Jonathan Nolan e Lisa Joy (que é produtora-executiva de Fallout) constantemente compartilhavam seu fascínio pelo ato de jogar, de se imergir em um mundo virtual, da forma que os videogames se tornaram simulações complexas e realistas. Enquanto a série da HBO explorou as questões éticas da nossa relação com os games, Fallout vem como uma celebração das peculiaridades que amamos nos jogos, como a evolução gradual dos personagens, a trilha sonora marcante, a exploração de mundos fantásticos e as missões paralelas bizarras.

Quando se trata de adaptações, o ideal é que sejam capazes de ficar de pé sozinhas. Fallout se sai bem como série de TV, mas é melhor apreciada quando entendida como parte de um universo muito maior e orgulhosamente ‘videogamístico’. É uma maratona televisiva muito agradável, mas que te deixará sedento para criar um novo save no seu título favorito da saga, ou então desbravar o pós-apocalipse nuclear pela primeira vez, assim como Lucy.

Com oito episódios, Fallout está disponível no catálogo do Amazon Prime Video.

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