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Dead Space é a modernização de um clássico atemporal | Review
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Dead Space é a modernização de um clássico atemporal | Review

Remake do game de 2008 acerta não só ao preservar a experiência original, mas também expandir suas qualidades

Arthur Eloi
Arthur Eloi
27.jan.23 às 15h06
Atualizado há cerca de 2 anos
Dead Space é a modernização de um clássico atemporal | Review
Dead Space (2023)/Divulgação

A indústria de games passa por um momento curioso. Com ciclos de desenvolvimento caros e longos, há certo medo de apostar em qualquer coisa que não seja um sucesso garantido, seja projetos originais ou mesmo a retomada de franquias consagradas.

Na lógica dos grandes estúdios, os remakes se tornaram a melhor forma de treinar novas equipes, retomar sagas dormentes, e entregar lançamentos para um público que já sabe mais ou menos o que esperar, atendendo tanto o nostálgico e o novato. O problema é que títulos mais recentes também entram na mira do raio reconstrutor, e naturalmente uma pergunta passa a pautar o debate: será que determinadas obras já precisam de um remake?

Dead Space, o survival horror da falecida Visceral Games de 2008, é um jogo que não precisa de um remake - o que não o isentou de ganhar um. Felizmente, a nova versão entende isso, e acerta ao expandir as melhores partes do clássico em uma recriação feita do zero.

Ainda que nunca tenha sido exatamente um sucesso de vendas, a saga é adorada por fãs de terror como uma das últimas franquias originais de survival horror. Sua jogabilidade é tensa, a atmosfera é memorável, e seus monstros são genuinamente horrendos. O clássico teve duas continuações, sendo uma bastante elogiada, enquanto a terceira e última é altamente divisiva, ao levar tudo por um caminho mais de ação. A conclusão da trilogia enterrou a franquia - até agora.

Pelas mãos da Motive Studio (Star Wars Squadrons), o primeiro jogo foi reconstruído no motor gráfico Frostbite, o mesmo da série Battlefield. O objetivo da desenvolvedora é resgatar a grandeza do título original, com visuais modernizados e melhorias nas mecânicas. Mas será que esse esforço é justificável quando se trata de algo que continua ótimo até hoje?

Horror atemporal

Assim como em 2008, Dead Space (2023) acompanha a jornada de Isaac Clarke pela USG Ishimura [Créditos: Divulgação]
Ambientado no futuro distante em que a humanidade já se espalhou pelas estrelas, o game segue um engenheiro espacial Isaac Clarke. Acompanhado de uma pequena equipe, você é enviado para investigar o que aconteceu na USG Ishimura, uma colossal nave mineradora à deriva no espaço - onde Nicole Brennan, a namorada do protagonista, atua como médica chefe.

Não demora quase nada para o grupo de resgate descobrir que algo horrendo aconteceu na Ishimura, ao se depararem com um massacre e uma infestação de Necromorfos, criaturas violentas que são cadáveres humanos reanimados e distorcidos. Munido apenas das ferramentas de trabalho, o protagonista precisa vagar pelos corredores escuros da nave, em busca tanto da namorada, quanto de entender a causa do incidente.

A campanha é linear e dura cerca de 12 horas, tempo em que Isaac explora os cantos mais obscuros da USG Ishimura. Além de lutar contra Necromorfos, eventualmente o engenheiro esbarra em uma conspiração envolvendo cultistas da igreja da Unitologia, que idolatram uma tecnologia alienígena conhecida como Marcador, que pode estar por trás de todo o banho de sangue.

Combater as criaturas deformadas é o ponto alto de Dead Space. Os monstros são visualmente grotescos, com entranhas expostas e longas garras afiadas (que, em outra vida, costumavam ser os ossos do braço de uma pessoa comum). Eles atacam forte, impiedosamente e de surpresa, encurralando os jogadores mais desatentos.

Para tornar tudo ainda mais sufocante, por boa parte da experiência seu único arsenal é uma Cortadora de Plasma, uma pistola que atira lasers na vertical ou horizontal. A forma mais eficiente de derrotar ou atrasar os inimigos é amputando seus membros. Isso significa frequentemente ter que alinhar tiros nos braços e pernas dos monstros enquanto eles marcham vorazmente em sua direção.

Com visual repaginado, os Necromorfos ficaram ainda mais grotescos [Créditos: Divulgação]
Há boa variedade de Necromorfos, com formas e ataques bastante diferentes. Um deles é inchado e carregado de vermes, e começa a rasgar a própria barriga para liberá-los assim que vê que está prestes a morrer. Já outro, que mais parece uma raia, é capaz de reanimar cadáveres. O desafio é controlar o estoque de munição, o espaço entre você e as criaturas, e também priorizar quem merece ser abatido primeiro.

Todo o apelo da saga é que não se trata de um fuzileiro espacial, mas sim de uma pessoa comum em uma situação extrema. Isaac Clarke se vira com o que tem, passa apertos, e se vê tendo que concluir uma série de tarefas para prosseguir em sua missão. Vez ou outra, alguns objetivos podem ser meio maçantes e repetitivos, especialmente na reta final, mas o game ainda conquista pela ótima trama e ambientação.

Quase como um cenário de Resident Evil no espaço, a USG Ishimura é inteiramente interconectada. Ao invés do glamour de uma mansão gótica, é um local que remete a uma fábrica inteiramente de metal, repleta de maquinário perigoso e ruídos estranhos. Não à toa essa se tornou uma das ambientações mais memoráveis dos games. Sua aura ameaçadora completa perfeitamente a brutalidade da violência gráfica e da jogabilidade de cerrar os dentes.

Todas essas qualidades e defeitos estão presentes em ambas as versões do jogo. A experiência de Dead Space é excelente pelo fato de que os acertos do original são atemporais. Jogar o novo não é tão diferente do antigo, salvo por algumas boas adições muito bem-vindas.

(Re)Encenação de um desastre

Visual repaginado do remake de Dead Space é bom, mas há ressalvas [Créditos: Captura de Tela]
Há uma noção de que um remake pode ser uma “segunda chance”, para corrigir o que não funcionou em algo. Isso é especialmente presente em videogames, visto que jogabilidades mais travadas de títulos e as narrativas mais simplórias dos clássicos são mal vistas pelos jogadores.

Não é o caso de Dead Space, que retorna praticamente idêntico ao material-base. A Motive Studio claramente demonstra muita reverência ao legado da Visceral, e aproveitou a recriação para modernizar muitos elementos. Ao invés de abordar o original como algo que precisava ser consertado, o estúdio apenas lapidou e ajustou o que já era excelente. Toda mudança ou adição trouxe algo para equilibrar, de forma que a sensação do game de 2008 fosse mantida mesmo com as novidades.

A movimentação de Isaac Clarke, por exemplo, é muito mais rápida e natural. Como forma de compensar isso, agora os Necromorfos também correm e saltam. Acredite, poucas coisas são tão horrendas como ver a criatura sanguinária disparando em sua direção em um corredor apertado, enquanto você tenta alinhar um tiro certeiro para não torrar munição.

Além das mecânicas, a grande motivação por trás de resgatar a obra é dar um tapa nos visuais e imaginar esse conto macabro nos belíssimos gráficos da Frostbite Engine. Há prós e contras nessa melhoria.

Esteticamente, é de encher os olhos, especialmente pela iluminação colorida que realça os corredores metálicos e a vislumbres de planetas alienígenas. É curioso que, nisso tudo, o estúdio tome a ousada decisão de usar suas técnicas avançadas com sutileza.

Mesmo com visuais de ponta, Dead Space frequentemente te deixará no escuro [Créditos: Captura de tela]
Você verá as reflexões perfeitas de ray tracing apenas em placas holográficas, ou então na armadura de Isaac Clarke. Mas a maior parte do tempo será na escuridão, se apegando à curta distância de sua lanterna, e tentando navegar por verdadeiros labirintos sombrios. A decisão não só garante a tensão, mas também o contraste entre o suspense do breu e a ocasional beleza da luz.

Por conta desses gráficos e efeitos avançados, o game chega apenas para PC, Xbox Series X | S e PlayStation 5, mas sua performance não dá razão para não existir no PS4 ou Xbox One. Quedas de frames são constantes, com trechos inteiramente rodados na casa dos 20fps ou menos (no modo Qualidade), e a implementação de ray tracing não é particularmente incrível como em um Control (2019) da vida.

Jogadores brasileiros têm motivo extra para reclamar, visto que o lançamento chega ao país apenas com legendas em português do Brasil. Em 2008, talvez até fosse aceitável ver um blockbuster distribuído pela EA Games que não viesse com opção de dublagem, mas hoje simplesmente não há desculpas.

Se fosse só pelo upgrade visual e leves alterações na jogabilidade, o remake seria facilmente descartável, como uma mera tentativa de tirar algo da geladeira, requentar e ainda assim servir meio morno aos jogadores famintos. Felizmente, os desenvolvedores deram um passo além, e decidiram alterar um pouco a estrutura do material-base.

Nos confins da USG Ishimura

Relatos em texto, áudio, hologramas ou nas paredes ajudam a expandir o universo de Dead Space [Créditos: Captura de tela]
Dead Space agora é um pouco menos linear. Ainda que a Motive tenha colocado como objetivo reproduzir o clássico com fidelidade, decidiu equilibrar isso com a expansão dos cenários e da narrativa. Essas mudanças podem não ser exatamente bombásticas, mas ajudam a justificar a existência do remake além da reencenação.

A nova USG Ishimura é um pouco mais ampla, e não há tantas barreiras para direcionar o jogador por um único caminho. Isso significa poder concluir objetivos na ordem que bem desejar, ou apenas explorar as várias salas em busca de colecionáveis e itens úteis para a sua jornada.

O game enfatiza em diversas ocasiões esse novo poder de escolha. Um capítulo, por exemplo, pede que você redirecione a energia elétrica para ativar um dispositivo importante. Olhando o quadro de força, é possível optar por usar a eletricidade que garante luzes ou ventilação no local - ou seja, decidir entre enfrentar inimigos no escuro, ou ter que administrar suas reservas de oxigênio enquanto combate as criaturas. A tarefa pode ser a mesma, mas a dinâmica de jogo é bem diferente entre as duas escolhas.

A melhoria na narrativa dá ainda mais sustento a esse design expansivo do mapa e da jogabilidade. A trama principal, que agora traz um Isaac Clarke com voz, tem texto e performances muito mais dramáticas e realistas, reflexo de como a indústria aprendeu algumas coisas sobre roteiro ao longo de mais de uma década. Os diálogos não existem só para dar contexto à matança, mas também para transmitir a confusão, medo e o instinto de sobrevivência de todos os afetados pelo incidente.

Dessa vez, o jogador ainda pode aprender mais sobre a crise na USG Ishimura através da exploração. Vários registros em áudio, texto e hologramas estão espalhados por toda a nave, e são facilmente um dos destaques da experiência. Os colecionáveis dão uma dimensão maior do que realmente aconteceu, e muito do que é falado nos relatos pode ser encontrado no cenário.

Não se engane, não é um game de mundo aberto e nem nada do tipo, mas esse toque de não-linearidade dá um gostinho de Prey (2017) ao remake, em que a curiosidade do jogador é recompensada com conhecimento das tragédias, dos tripulantes da nave e também da conspiração que corre de fundo.

Depois de tudo isso, vale a pergunta: Dead Space (2008) precisava de um remake? A resposta é não, já que o que consagra a nova versão são as qualidades que se mantêm atemporais no original. Ainda assim, sua modernização definitivamente não deve ser desmerecida. A Motive preservou o legado da obra da Visceral, e fez sua contribuição através de expandir esse universo para permitir mais atuação do jogador, e também para aprofundar a narrativa.

Os fãs do clássico, que lamentam a morte prematura da série, recebem um presente que vai além do saudosismo. Já os novatos que não conheceram Dead Space quando era viva poderão entender bem o que tornou a saga um ícone do survival horror - mas, é bom lembrar, a mesma impressão pode ser tirada ao jogar o game de 2008 nos dias de hoje.

Dead Space (2023) está disponível para Xbox Series X | SPlayStation 5PC. A review acima foi feita com base na versão de Xbox Series X, no modo Qualidade, com cópia enviada pela distribuidora.

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