Vocês já devem ter percebido que nos últimos anos tenho levantado a bandeira dos jogos independentes, né? Vou aproveitar este espaço agora para explicar um dos motivos da minha “luta”.
O que de imediato me faz adorar jogos independentes é a variedade de temas e focos de gameplay que podem ser explorados/inovados. De certa maneira, qualquer jogo pode abordar qualquer coisa, porém é muito improvável que desenvolvedoras de jogos triplo-A se arrisquem a experimentar e testar conceitos inusitados como fazem os indies. Mas essa afirmação não é uma crítica! Toda EMPRESA tem que trabalhar de olho nos resultados, e, para isso, muitas vezes, é mais seguro se ater a modelos/padrões previamente testados.
Acontece que, por esse mesmo motivo, alguns artistas se sentem cerceados em sua criatividade e acabam tendo na produção independente um meio de extravasar sua imaginação. Exemplo disso ocorreu em agosto de 2013 com o desenvolvedor Lucas Pope, ex-funcionário da Naughty Dog. Após trabalhar na série Uncharted, resolveu pedir as contas. Estava cansado do mercado triplo-A e queria mais liberdade. Já ouvi boatos de que a Naugthy Dog não era lá uma empresa muito boa de se trabalhar, mas, como boato é boato, melhor eu nem contar aqui (mesmo que já tenha contado).

Depois de largar o emprego, Pope lançou um jogo que tinha como foco a chateação e a tensão de se passar por uma barreira alfandegária. Usando suas experiências pessoais, ele achou que esse era um bom plot para um novo game. Resultado: fez um jogo sobre BUROCRACIA!
Vocês entendem o quão bizarra é essa aposta?! Se um funcionário de uma grande desenvolvedora propusesse um tema desse, teria liberdade e real possibilidade de implementar uma ideia tão diferente assim no desenvolvimento de um grande lançamento? Penso que não, porque que jogador iria querer lidar com burocracia em seu tempo de lazer?
O que me faz querer jogar? Muito do que me seduz é a possibilidade de fazer ou ser algo que não faria ou seria na vida real: lutar sobre um trem em movimento, escalar as costas de colossos, invadir um castelo assombrado para resgatar a honra da minha família, pular enormes penhascos e desafiar tartarugas mortais para descobrir que a princesa está em outro castelo. Quando sento pra jogar, não quero carimbar passaportes e conferir as normas alfandegárias do dia! Ou quero?
Bem, Papers, please me faz querer, porque usa o que convém da burocracia e transforma o ato de carimbar papéis e seguir um conjunto de regras alfandegárias em um complicado e divertido jogo. Existe um universo bem legalzinho que foi criado ao redor dessa dinâmica, mas a Pedra Arken dessa montanha é a jogabilidade. O game designer partiu de um princípio de estrutura organizacional burocrática para criar as bases do gameplay do jogo, e isso o transformou em uma experiência inesperada e muito legal de se explorar.
Além disso, me levantou uma questão que direciono a você: o que o motiva a jogar?
*Didi Braguinha é cofundador do Matando Robôs Gigantes e criador do IndieDi, canal sobre games indie. Está na internet desde que só tinha mato por aqui, sempre falando de games, quadrinhos, séries e cinema.