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Duna: Parte 2 cumpre seu destino em uma apoteose primorosa | Crítica
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Duna: Parte 2 cumpre seu destino em uma apoteose primorosa | Crítica

Com Timothée Chalamet, Zendaya e companhia, filme expande o já grandioso universo da saga

Gabriel Avila
Gabriel Avila
29.fev.24 às 11h49
Atualizado há cerca de 1 ano
Duna: Parte 2 cumpre seu destino em uma apoteose primorosa | Crítica
Duna: Parte 2/Warner/Divulgação

Duna: Parte 2 nasceu como o híbrido entre uma promessa e uma necessidade. Afinal de contas, a primeira parte não adaptou o clássico livro de Frank Herbert por inteiro, chegando ao fim antes de alcançar alguns dos pontos altos da história, incluindo seu desfecho. Justificada pela impossibilidade de condensar toda a obra original em um único longa, essa decisão jogou todo o peso para a sequência, que cumpre o destino traçado a ela de forma imponente.

O segundo filme usa como base a sólida construção do anterior para expandir horizontes em praticamente todas as frentes. Uma tarefa ligeiramente mais fácil agora que muitas das engrenagens culturais, políticas e religiosas, assim como o protagonista, já foram bem estabelecidas. Porém, o novo longa não se contenta em repetir o que deu certo anteriormente e dá necessários passos adiante rumo à completude que modifica o projeto como um todo.

Na Parte 2, Paul Atreides (Timothée Chalamet) e sua mãe, Lady Jessica (Rebecca Ferguson), pedem abrigo aos Fremen após a família ser traída e massacrada. Natural do deserto de Arrakis, o grupo aceita receber mãe e filho pela possibilidade de serem figuras-chave de uma antiga profecia. Uma deixa abraçada de formas diferentes pela dupla. Para garantir a própria sobrevivência, Paul precisa não apenas aprender a cultura e os costumes dos nativos, como também convencê-los de que pode ser útil na cruzada para libertar o planeta desértico dos malignos Harkonnen.

Durante a etapa inicial, o diretor Denis Villeneuve retoma o senso de aventura e deslumbramento que marcou o primeiro filme. A integração do jovem Atreides é conduzida com uma empolgação calculada para recapturar a afeição do público a cada nova descoberta ou teste. Uma forma sagaz de enriquecer a evolução do protagonista e, ao mesmo tempo, a cultura que o cerca.

Esse foco confere novas camadas a personagens veteranos, que ganham espaço para crescer, mesmo com a incumbência de representar diferentes perspectivas para a ascensão de Paul. O embate entre a fé representada por Stilgar (Javier Bardem) e o ceticismo encarnado na turma de Chani (Zendaya), temperado pelos interesses escusos de Lady Jessica, aumentam a escala e dão os primeiros passos em direção ao contraste que torna o longa grandioso.

A Parte 1 não foi nada sutil ao dividir sua narrativa entre heróis, representados pelos Atreides, e vilões, encarnados nos Harkonnen. Um maniqueísmo que, por vezes, beirou o caricato, mas que se justifica na Parte 2, dedicada a diluir a linha que separa o “preto no branco” e investir em tons de cinza que tornam essa nova etapa ainda mais interessante. Uma evolução natural do simplista conflito de “bem versus mal”, que ganha vida em uma condução madura.

O reflexo sombrio que engrandece Duna: Parte 2

Uma das partes mais importantes para a ascensão de Paul Atreides em Duna: Parte 2 é o uso da fé, que toma conta dos pensamentos dele e de praticamente todos que o cercam. Essa crença é parcialmente justificada e alimentada por profecias, que são fonte de temor e esperança, mas que, narrativamente, poderiam retirar qualquer imprevisibilidade da trama. Afinal de contas, se tudo já está escrito e fadado a acontecer, onde está a ameaça?

Em resposta, somos apresentados ao outro lado dessa história. O filme também acompanha os efeitos da queda da Casa Atreides em outros pontos do universo, em especial entre os Harkonnen. Mais do que o próprio Barão (Stellan Skarsgard), o grande destaque é Feyd-Rautha, que explica sua ausência na primeira parte ao ganhar uma boa porção da história para si.

O vilão é explorado como uma espécie de espelho sombrio de Paul. Desenvolvido sem qualquer sutileza, esse paralelo funciona em grande parte pela presença de Austin Butler. O ator domina praticamente todas as cenas em que aparece, graças à forma como dá vida à psicopatia do personagem, com lampejos de uma vulnerabilidade que o impede de cair em um grande estereótipo.

A chegada do antagonista amplia o escopo de Duna: Parte 2 ao garantir mais tempo da Casa Harkonnen, apresentando um pouco mais de suas tradições e funcionamento interno. Um contraste que acontece também visualmente, já que o escaldante e árido deserto de Arrakis dá lugar aos estéreis e frios mundos sombrios habitados por eles – com destaque para a arrepiante sequência em preto e branco que marca a chegada de Feyd-Rautha.

A tensão nos dois núcleos, temperada pela apreensão daqueles que não tomam lados – como é o caso da Princesa Irulan (Florence Pugh) –, é alimentada até explodir com o espetáculo monumental esperado desde a Parte 1. Os embates carregam o peso de serem a culminação de conflitos graves e complexos que não têm respostas fáceis, fazendo com que mesmo as vitórias não garantam paz. Uma cortesia dos tais tons de cinza que borram as divisas do “preto no branco”.

Fruto de uma longa construção, a apoteose de Duna: Parte 2 se consagra como a grande obra de Denis Villeneuve, em partes por combinar tudo o que o cineasta desenvolveu ao longo de seus filmes. O longa colhe os frutos de toda a carreira do cineasta, como se ele tivesse guardado as lições que aprendeu não só nas ficções científicas – como A Chegada (2016) e Blade Runner 2049 (2017) –, como também no suspense – Os Suspeitos (2013) e Sicario: Terra de Ninguém (2015) – , para colocar tudo em prática em Duna.

Na tradução do livro para o cinema, o cineasta capta a grandiosidade e os atributos desse universo, por mais fantásticos e surreais, sob uma perspectiva naturalista e quase documental. Um olhar mais pé no chão que ecoa seus projetos anteriores ao nunca perder de vida a escala e o tamanho dos humanos em um mundo cheio de naves e vermes de areia.

Tal condução chega a um novo patamar na nova parceria com Greig Fraser, cuja direção de fotografia é irretocável no retrato dos diferentes mundos que os personagens habitam, que se tornam impressionantes quando se chocam da forma mais espetacular e catártica possível. Um trabalho que se torna ainda mais notável graças à confiança que Villeneuve deposita no poder das imagens e permite que elas não só contem boa parte da história, como sejam as primeiras a produzir sentidos e sentimentos, antes mesmo que alguém possa abrir a boca.

Essa combinação torna o espetáculo de Duna ainda mais denso e implacável. Afinal de contas, o longa abandona o que parecia ser uma clássica jornada do herói e mergulha cada vez mais fundo nos tons de cinza que desenvolveu com tanto cuidado. Sem respostas fáceis, a produção impacta justamente por ter a coragem de oferecer uma conclusão que se torna recompensadora justamente pelo sabor agridoce.

É possível que muitos dos méritos citados acima venham diretamente da obra original, já que o livro de Frank Herbert não se tornou tão cultuado à toa. É possível até que Denis Villeneuve e sua equipe não tenham dado vida à adaptação mais fiel possível da obra original. Porém, assim como no teste final para virar um fremen, é preciso mais que coragem para conseguir montar um titã venerado. E, mesmo se não atingir o auge da obra original, esses filmes ao menos nos deixou um sonho belo e arrebatador construído em areia.

Duna: Parte 2 está em cartaz nos cinemas do Brasil.

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