Nós já demos nossa opinião para os primeiros sete episódios da segunda temporada de Demolidor, mas ainda há muito para falar. Agora que todos os episódios estão disponíveis, vamos nos aprofundar mais na narrativa e, eventualmente, discutir pequenos spoilers. Quando Matt Murdock (Charlie Cox) trocou de uniforme no final da primeira temporada, parece que a série também fez uma troca. A essência ainda é a mesma, mas com o comando dos roteiristas Doug Petrie e Marco Ramirez, a nova temporada abraça mais o lado de super-herói de Homem Sem Medo de Hell's Kitchen, adicionando outros personagens dos quadrinhos da Marvel, e o colocando para enfrentar vilões cujas forças não estão na política ou estratégia, e sim na habilidade de matar outras pessoas.
A série Demolidor se divide em dois núcleos. Um que lida com Frank Castle (Jon Bernthal), o Justiceiro, e uma suposta conspiração dentro de órgãos oficiais de Nova York; e outro com Elektra (Elodie Yung), ex-namorada de Matt em sua luta contra o grupo de ninjas The Hand. Tudo isso enquanto Foggy (Elden Hanson) e Karen (Deborah Ann Woll) questionam o protagonista sobre sua dedicação à firma Nelson & Murdock, e consequentemente, sua amizade. Mas vamos por partes.
Justiça/Punição
A parte mais forte da temporada, e sem dúvida a que vai deixar muitos fãs da Marvel Comics felizes, é a adição do Justiceiro. O personagem já foi adaptado para a telona em alguns filmes, mas esta é de longe sua melhor interpretação. Se na primeira temporada a atuação de Vincent D'Onofrio tomou conta dos episódios, agora é a vez de Bernthal. Seu trabalho em The Walking Dead, ou filmes como Sicario, Lobo de Wall Street e Corações de Ferro, não faz jus à capacidade do ator. Ele foi sempre atrelado a papéis que se encaixam de alguma forma no "engraçadinho arrogante e agressivo" mas aqui, Bernthal recebe a chance de ser mais flexível, usar outras emoções e tem o papel mais complexo da série. O Justiceiro é um personagem trágico, e muito da série questiona se essa tragédia justifica as ações cometidas por ele depois. O ator se eleva ao desafio de caminhar nesse território cinza.
Não é surpresa ver que o público agora quer uma série dedicada ao Justiceiro, e a Netflix estaria desperdiçando uma chance de ouro de não continuar explorando Bernthal neste papel.
Felizmente, a qualidade do arco do Justiceiro não fica apenas na atuação, e se estende também para o roteiro, particularmente nos episódios 3 e 4, que representam um embate físico e filosófico entre o Demolidor e Justiceiro. Ambos agem fora da lei e seus alvos são criminosos, mas um escolhe crer na capacidade humana de redenção enquanto outro acredita que a solução para limpar Nova York é pôr mais pessoas nos cemitérios. A série nunca se limita a dividir os personagens entre "certo" e "errado", sempre questionando as motivações e ações dos dois. Talvez Murdock realmente não esteja solucionado nada, apenas jogando poeira pra baixo do tapete. Talvez Castle seja um psicopata tão maléfico quanto as pessoas que mata, mas essas respostas não serão dadas de maneiras fáceis. Ambos terão que sangrar e se manter firme na sua busca para encontrar isso.
Ponto Negativo
Entretanto, se a caracterização e confronto dos personagens é sempre boa, o enredo que move o arco do Justiceiro cai bastante no final. Eventualmente, a história que criou Frank Castle se torna uma série de reviravoltas que beiram a coincidência, e a última revelação, a de quem é o verdadeiro responsável pela tragédia que afetou sua vida é decepcionante, mas Bernthal é tão bom que ele consegue trazer impacto e peso para cenas que, nas mão de outros atores, seriam distantes e frias.
Ex-Namoradas
Na contramão está Elektra, cujo arco começa bem chato, mas é desenvolvido de maneira divertida e satisfatória. É aqui que o lado quadrinhos de Demolidor se desdobra, fugindo do realismo e suspense do Justiceiro e entrando no território de ação e super poderes com mais coragem e liberdade. A personagem, tanto na sua concepção quanto na atuação de Elodie Yung, começa de uma forma muito rasa. Ela é imprudente, impulsiva, sexy, imprevisível, mas não parece ser uma pessoa, apenas um arquétipo. Alguém que desafia Murdock de uma forma diferente da de Castle, mas muito menos interessante. Apesar de ter o mesmo número de episódios e tempo, o arco da Elektra sempre pareceu uma narrativa B, mas isso muda na segunda metade da temporada.
Depois de alguns episódios, os roteiristas param de tentar contar uma história sobre Matt, e focam numa batalha por quem é Elektra. É aqui que a firmeza que Murdock precisa adquirir nas suas interações com Castle precisa ser confirmada, já que ele precisa salvar sua ex-namorada não da morte (okay, algumas vezes ele precisa salvá-la da morte também), mas sim de si mesma. Yung brilha muito mais quando as coisas mudam, abrindo um lado mais vulnerável e humano da anti-heroína que ajuda a se conectar com seu lado da temporada.
A jornada do Demolidor e Elektra contra a Hand na temporada também tem altos e baixos. Por um lado, ela apresenta um desafio para o personagem com elementos supostamente sobrenaturais, mas por outro, não há um personagem que represente a ameaça de uma forma tão urgente e eficaz como foi o caso de Fisk na primeira temporada.
Veredito
Demolidor combina esses dois arcos com uma grande habilidade, quando o assunto é coreografia de ação, e é bom ver a evolução da equipe na segunda temporada. As lutas se desenrolam com mais uso dos poderes de Murdock e fica claro como isso o diferencia das outras pessoas no combate. Além disso, os personagens secundários, Foggy e Karen, também brilham nas atuações e na forma como crescem independentemente de Matt, protagonizando as próprias histórias. Infelizmente, Cox é o elo mais fraco disso tudo. Ele não é ruim, mas quando colocado do lado dos outros atores - particularmente, Henson, Woll e definitivamente Bernthal, fica difícil comparar.
Demolidor mudou. A essência ainda é a mesma, mas o estilo é outro, e a série se beneficia por não tentar repetir as mesmas coisas que tornaram a primeira temporada tão boa. Parece que o mundo e personagens estão andando pra frente, encontrando novos desafios pessoais e profissionais, e crescendo na face disso tudo. Trocando suspense por ação na melhor pegada quadrinhos, e um enredo detalhado por personagens mais bem construídos e interpretados. A Netflix conseguiu manter Hell's Kitchen interessante.
Agora, vamos torcer pra uma terceira temporada com o Bullseye!
E você, o que achou dessa temporada?