Em praticamente qualquer jogo aguardado há muito tempo ou desenvolvido por uma equipe criativa muito amada pelo público, existe uma torcida para que o esforço resulte em um bom game. No caso de The Last Guardian, novo jogo do Team ICO, isso era mais que uma torcida, era quase uma certeza dos fãs.
O game estava em desenvolvimento há quase 10 anos, foi pensado inicialmente para PlayStation 3, e pertence largamente ao mesmo estúdio responsável por ICO e Shadow of the Colossus. A expectativa era que o jogo fosse tão bom ou melhor que os jogos anteriores do estúdio, mas mesmo depois de tanto tempo e tantos adiamentos, o jogo não atingiu o potencial que esperávamos.
Acordando de um sonho
Em The Last Guardian você controla um garoto que desperta sem entender onde está e com estranhas marcas em sua pele. Ao seu lado está uma criatura gigantesca e selvagem, com um visual que mistura elementos de aves e mamíferos e que, segundo o próprio menino explica, é uma criatura mítica que é capaz de devorar humanos.
Só que o animal, ao qual o jovem se refere como Trico, não está em sua melhor forma. Preso por uma corrente, com asas machucadas e lanças presas no corpo, ele parece estar à beira da morte. Com hesitação, o menino tenta ajudar a criatura ferida. Mesmo que nenhum dos dois confie um no outro, eles vão precisar cooperar para conseguir alcançar seus próprios objetivos. E assim, iniciam juntos uma jornada.
Selvagem
Trico é um animal selvagem. Ele tem suas próprias vontades e às vezes simplesmente ignora comandos sem motivos aparentes. Na teoria, poderia ser um elemento interessante que daria mais realismo ao game. Entretanto, na prática, é um dos recursos mais frustantes e quebrados que um jogo poderia implementar.
Estar prestes a cumprir um objetivo e ver o progresso dos últimos minutos sendo destruído porque Trico resolveu simplesmente andar para o lado oposto da fase é enfurecedor. Além disso, tentar convencer o animal a retornar para a posição correta às vezes é confuso pois não fica claro se aquilo que você está tentando fazer (por exemplo, subir em uma plataforma) não é possível ou se a criatura simplesmente está em um loop de animação diferente.
Além disso, alguns pontos mostram que a Inteligência Artificial não está simplesmente simulando um animal selvagem, e sim ações aleatórias e mal programadas. Por exemplo: para um animal com fome, alimentos jogados em sua direção deveriam ser entendidos como uma ação prioritária já que comer é um instinto básico. Porém, um barril com comida arremessado na direção de Trico pode ser devorado ainda no ar ou, literalmente, bater na cara dele e ser completamente ignorado (o que envolve o jogador pegar novamente o item e insistir várias vezes até que o bicho finalmente coma).
É possível entender a intenção por trás desse tipo de escolha de design: fazer um companheiro que você não tem total controle. Mas ao longo do jogo, fica fácil de perceber que não foi implementada de maneira correta, tornando-se um problema.
Quadro a quadro
The Last Guardian tem cenários bonitos, muitas vezes escondidos por uma névoa, e detalhes impressionantes no modelo de Trico, com penas que parecem dar vida à criatura. Só que esses detalhes não foram bem otimizados.
Em inúmeros momentos do game as quedas de frame abruptas mostram que algo ali não está em sua melhor forma. Isso fica ainda mais óbvio em trechos com muitos efeitos diferentes, especialmente nas horas finais. Essas inconsistências na taxa de quadro afetam a imersão e chegam a atrapalhar em alguns momentos cruciais, como saltos em cenários que estão desmoronando, já que o timing é quebrado por conta da lentidão não-proposital do jogo.
Para piorar, a câmera também é um aspecto negativo e extremamente defasado, semelhante a alguns jogos de PlayStation 2. Ela quase sempre é difícil de posicionar ou se reajusta automaticamente para um eixo no qual fica impossível de enxergar o objetivo seguinte, seja ele um alvo ou uma plataforma que o jogador deseja alcançar. Em alguns puzzles, o maior desafio não é entender o que deve ser feito e sim como manter a câmera na posição correta por tempo suficiente para chegar até o final.
Acertos
The Last Guardian acerta em alguns pontos. Nas cerca de 13 horas que levamos para terminar o jogo, a maneira como a amizade entre o menino e Trico é construída é genuinamente cativante e verossímil, passando pela total desconfiança, por momentos nos quais eles começam a quase se comunicar, até chegar em um companheirismo verdadeiro. É impactante ver essa mudança e, mais que isso, fazer parte dela.
A trama também tem momentos incrivelmente belos, como poderíamos esperar de um jogo do Team ICO, especialmente em suas horas finais. Talvez só não sejam tão surpreendentes ou marcantes quanto Shadow of the Colossus ou ICO.
Se você espera há muito tempo por The Last Guardian, não existe motivo para desistir agora. Ele faz especialmente sentido para quem jogou games da era do PS2 e talvez tenha mais leniência com deslizes e problemas técnicos que eram recorrentes naquela época. Saiba apenas que a jornada terá muitas frustrações, mas um final que vale a pena bem no fim do horizonte.
The Last Guardian foi lançado no dia 6 de dezembro para Playstation 4. A cópia para o review foi cedida pela Sony.