Após morrer, Maximus (Russell Crowe) não reencontra a esposa e o filho. Em vez disso, ele se vê diante de Júpiter e outros membros do panteão romano. Estes, então, lhe propõem um trato: para poder se reunir com os entes amados, o finado general deve antes voltar ao mundo dos vivos e matar um certo pregador que vem arrebanhando seguidores para uma nova e poderosa divindade.
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Não é isso o que acontece em Gladiador II. Mas bem que poderia, caso o enredo escrito pelo cantor e compositor Nick Cave tivesse recebido sinal verde. Com o sucesso do primeiro filme, em 2000, logo se iniciaram as conversas sobre uma eventual sequência (ou prelúdio). Foi ainda naquela época que o próprio Russell Crowe convocou Cave para bolar um jeito de fazer seu personagem retornar para o novo longa-metragem. Mas a versão bizarra criada pelo roqueiro não agradou o astro.
Passaram-se mais de duas décadas até que o projeto finalmente saísse do papel. E para surpresa de ninguém, prevaleceu a visão original e bem mais conservadora dos executivos. Na trama, após um embate com soldados romanos, Hanno (Paul Mescal) é feito escravo e, nas mãos do mercador Macrinus (Denzel Washington), se torna um gladiador. Ele então abraça essa sina diante da possibilidade de se vingar do general Acacius (Pedro Pascal), que considera responsável pela morte de sua esposa.

Se a premissa soa um tanto familiar demais, é porque o roteiro de David Scarpa não faz a mínima questão de se diferenciar do antecessor. Segue a mesma estrutura narrativa, traz velhos personagens de volta — Lucilla (Connie Nielsen), em papel de relativo destaque, e o senador Gracchus (Derek Jacobi), pouco mais que um easter egg humano — e repete falas do original a torto e a direito, mesmo que façam pouco sentido no novo contexto.
Até o recurso de reinterpretar um evento histórico envolvendo imperadores é copiado do primeiro filme: naquele, o fato de o Commodus real ter realmente lutado como gladiador; neste, a relação fratricida entre Geta (Joseph Quinn) e Caracalla (Fred Hechinger, comicamente parecido com o príncipe que só queria cantar, interpretado por Terry Jones em Monty Python em Busca do Cálice Sagrado).
A escolha mais questionável nesse aspecto, porém, é justamente a central. Mesmo que um dos trailers não tivesse entregado de cara a verdadeira identidade de Hanno, a ideia em si é pouco original, e sua execução torna tudo ainda mais previsível e banal. Pior: enfraquece o arco do protagonista ao privá-lo de sua agência, já que tudo é questão de genética e destino, além de transformar todo o segundo ato em um grande melodrama de telenovela.
Quando tenta seguir novos caminhos, o longa chega a esbarrar em conceitos interessantes, mas falha em seu desenvolvimento. Por instantes, flerta com discussões sobre os papéis de vilão e aliado e sobre o cenário sócioeconômico de Roma, mas logo as abandona em favor de resoluções simplórias. E o desfecho, que em teoria deveria refletir sobre o ciclo de violência sem fim dos césares, acaba se resumindo a um dos monólogos mais piegas e constrangedores que Hollywood produziu recentemente.

Nem o diretor Ridley Scott consegue trazer uma centelha criativa ao projeto, contentando-se em dobrar a aposta em termos visuais. Por exemplo, se recriar o Coliseu em seu auge não provoca o mesmo encantamento de duas décadas atrás, a solução é simplesmente encenar batalhas maiores, com animais diferentes e sobre as águas — e nem por isso elas conseguem ser mais memoráveis.
Gladiador II tem aspirações medíocres: lembrar o filme original e, quem sabe, tirar algum proveito de seu prestígio. O resultado não poderia ser outro — é um épico insípido e esquecível. Quase faz o espectador desejar que a versão bizarra criada por Nick Cave tivesse sido produzida em vez dessa.
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