Praticamente toda obra cinematográfica lançada atualmente tem algum tipo de efeito visual ou prático. Em gêneros mais fantasiosos, como a ficção científica, os cineastas abusam desses artifícios. Nós, que amamos os filmes do gênero, temos muito a agradecer ao ilusionista e cineasta George Méliès — o francês que é tema de um dos Doodles mais legais já feitos pelo Google.
Inspirados pela incrível história da vida e obra de Méliès, o Google — em parceria com a Nexus Studio e The Cinémathèque Française — criou o primeiro Doodle em 360º, feito especialmente para ser aproveitado com um óculos de realidade virtual.

A animação conta a história do diretor e utiliza diversos truques de ilusionismo criados por ele em suas obras. Objetos desaparecendo, humanos replicados, cabeças saltitantes, efeitos rítmicos e muitos outros truques marcaram a assinatura do francês que merece um título concedido a poucos: visionário.
A animação da Nexus foi intitulada como “Back to the Moon” e celebra os 106 anos do lançamento da 'À la conquête du pôle' (A conquista do polo), que estreou no dia 3 de maio de 1912.
Para assistir o filme em todo o seu esplendor, recomendamos o uso de um celular com tecnologia de giroscópio. Também é possível baixar o aplicativo Google Spotlight Stories no seu smartphone, seja ele Android ou Apple, e ver a animação em melhor qualidade. Para navegar pelo vídeo, basta mexer o celular ou arrastar o mouse pelo player:
Sonhem comigo
Os irmãos Lumière criaram o cinema em 1895. Na época, para mostrar a tecnologia inédita, os dois exibiram uma sequência de um trem à vapor saindo da estação. Registros contam que a burguesia presente na mostra entrou em histeria e o público correu em desespero para longe da sala de cinema.
Dentre os espectadores da sessão havia um mágico profissional que não se assustou com o que viu. Pelo contrário, ele ficou muito intrigado com a invenção e, encantado, procurou os inventores para tentar comprar um exemplar daquela caixa estranha chamada "filmadora". Em uma tentativa de manter o controle da criação, os irmãos recusaram a oferta de compra do ilusionista chamado George Méliès.
Mais do que tudo, Méliès era um sonhador. Ele não desistiu, foi até Londres, comprou um projetor de filmes animados e criou sua própria sala de cinema. Ele experimentou com inúmeras possibilidades dentro do meio e aprendeu a fazer filmes quando o meio, como o conhecemos, nem existia. Por tentativa e erro, ele produzia pequenas sequências mirabolantes: estima-se que, de 1896 até 1913, ele tenha produzido mais de 500 filmes. Com a deterioração e a má preservação, muitos destes negativos se perderam e não temos arquivos históricos disso.
Nas suas maluquices, o mágico inventou efeitos que impressionaram audiências e são usados até hoje para realizar sequências cinematográficas de forma prática em produções hollywoodianas. Artifícios como "time-lapse", clones, pirotecnia e máquinas com pistões deixaram o público boquiaberto. Méliès, realmente, fazia mágica na tela.

Méliès realmente não era só um cineasta, ele era um sonhador. O francês foi pioneiro no gênero de ficção científica e, constantemente, sonhava com o novo milênio, com a vinda de ETs, com a exploração espacial e com todo e qualquer tipo de futuro estranho que possamos pensar.
Com sua imaginação, ele flertou com a ideia de irmos além do nosso próprio planeta. Em seu filme mais conhecido, Le Voyage dans la Lune (A Viagem à Lua) um grupo de exploradores vai até o nosso satélite natural encontrar seres extraterrestres e explorar o desconhecido. Aficionado por Júlio Verne, a obra é uma adaptação direta de "Da Terra à Lua" e tem uma das sequências mais famosas da história do cinema. O momento em que a espaçonave terráquea atinge o olho da Lua é um ícone do cinema clássico e uma imagem reproduzida sempre que se menciona a época.
Com o início do novo milênio, a carreira de Méliès começou a degringolar. Ele assinou um contrato de parceria com o produtor Charles Pathé e, então, seus projetos começaram a ser distribuídos pela Pathé Filmes. A produtora investiu pesado no cineasta e ele começou a realizar trabalhos ainda mais experimentais com novas tecnologias. O francês foi um dos primeiros diretores a ter acesso a lentes com pequena abertura e grande amplitude focal, mas seus filmes seguintes (Cinderela e O Caso Dreyfus) deram prejuízo e a dupla recém-formada se afundou em dívidas.
Já em baixa e com a eclosão da Guerra Mundial, as propriedades de Méliès foram confiscadas pelo governo e usadas nos frontes por soldados franceses. Grande parte dos negativos de seus filmes foram derretidos para conseguir prata e celuloide, recursos usados para fazer projéteis. Estima-se que apenas 200 negativos dos 534 filmes de Mélies foram salvos.
George Méliès foi um dos cineastas mais influentes da história do cinema. Sua contribuição para narrativas fantásticas e efeitos especiais é praticamente imensurável, e o fato de termos a ficção científica como um dos gêneros mais proeminentes da atualidade deve-se muito ao olhar visionário dele. Acima de tudo, o ilusionista que mudou o rumo do cinema era um sonhador. Esse lado apaixonado do cineasta foi mostrado no filme A Invenção de Hugo Cabret (2011) que, em partes, conta a história de vida dele. Em uma das melhores cenas do longa, Ben Kinsley, na pele de Méliès, declama uma das frases mais interessantes do diretor e demonstra, em versos, como o mágico francês enganava pessoas e usava o cinema para transbordar sua fértil imaginação. Venha sonhar com Méliès.
Meus amigos, eu falo com vocês nessa noite da forma que vocês verdadeiramente são: magos, sereias, viajantes, aventureiros, feiticeiros... Por isso, venham sonhar comigo.