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Skinamarink é o terror mais intrigante - e divisivo - do ano | Crítica
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Skinamarink é o terror mais intrigante - e divisivo - do ano | Crítica

Entre genial ou insuportável, filme de horror experimental merece atenção por seu intenso pesadelo surreal

Arthur Eloi
Arthur Eloi
22.mar.23 às 09h00
Atualizado há mais de 1 ano
Skinamarink é o terror mais intrigante - e divisivo - do ano | Crítica
Skinamarink: Canção de Ninar/A2 Filmes/Divulgação

Se você é um fã de horror que transita pelas redes sociais, já deve ter esbarrado em uma palavra bastante estranha: Skinamarink. A popularidade desse pequeno filme de terror canadense é quase tão elusiva quanto a obra em si, tendo despertado o fascínio dos cantos mais macabros do TikTok e do Twitter no final de 2022.

Agora, o longa enfim chega ao Brasil pelas mãos da A2 Filmes, com o título oficial de Skinamarink: Canção de Ninar. E pode ter certeza de uma coisa: poucos filmes são tão “ame ou odeie” quanto a obra do diretor novato Kyle Edward Ball - e essa é a maior força do projeto.

Por mais que seu status de cult seja sim impressionante, não é realmente surpreendente  que a produção tenha caído nas graças dos amantes de creepypasta internet afora. Com estética de VHS de baixa fidelidade, repleta de ruídos e chiados, o longa segue dois irmãos pequenos que acordam em uma noite bastante macabra. Após perceberem que estão sozinhos em casa, o local começa a mudar de formas imprevisíveis, com portas e janelas desaparecendo. Para intensificar tudo, uma presença macabra começa a se comunicar com as crianças.

Skinamarink faz relembrar nosso primeiro contato com o medo [Créditos: Divulgação]
A premissa é simples e não vai muito além disso, mas apenas porque Kyle Edward Ball prefere se ocupar em desenvolver a atmosfera de sua obra ao invés da trama. Logo de início fica claro que nada é o que parece: os enquadramentos são levemente tortos e descentralizados, as vozes são abafadas ou cochichadas, e o espectador nunca realmente vê o rosto das crianças.

Essa abordagem beira a nostalgia de uma forma bastante deturpada. Ao invés de relembrar carinhosamente da infância, como faz uma Stranger Things da vida, Skinamarink quer inserir o público no meio de um pesadelo infantil. Toda sua aura é moldada pelo primeiro contato com o medo, instigado pelas figuras assustadoras nos cantos desolados de nossos próprios quartos.

O longa cria aquela sensação de acordar desorientado no meio da noite, e apela para todas as vozes e vultos da escuridão que faziam sua mente correr loucamente pelos cenários mais macabros que conseguia imaginar. Não há adultos que possam te socorrer e acalmar, e nem mesmo existe a possibilidade de escapar de casa. As crianças, assim como os espectadores, estão confinados com as sombras e barulhos amedrontadores.

O diretor exerce um invejável autocontrole na experiência. Nunca se deixa seduzir pelo susto, e nem pela possibilidade de entregar as tão desejadas respostas. Tudo é carinhosamente confeccionado para te deixar desconfortável o bastante para que sua própria mente passe a imaginar os horrores que vagam pelo breu. O design de som, com vozes medonhas e barulhos do além, dão vontade de olhar por cima dos ombros a todo momento, para se certificar de que tudo está vindo apenas da tela. É esse apego quase obsessivo com o desconforto que torna Skinamarink tão divisivo.

Basta entrar na seção de críticas do filme no Letterboxd, ou então buscar pelo título no Twitter, que você será recepcionado apenas com opiniões extremas sobre a obra. Isso não é um problema, mas sim o melhor cenário possível. Disrupção é o objetivo final de todo trabalho altamente experimental. E Skinamarink nada mais é do que um teste de Rorschach, que traz à tona suas próprias experiências com o macabro e as preferências quanto ao horror no audiovisual. Mais do que nunca, é preciso assistir e refletir sobre como esse experimento ressoa com você.

As vozes e vultos de Skinamarink podem não funcionar para você - e tá tudo bem [Créditos: Divulgação]
E você não precisa gostar, claro. Se me permite falar de forma um pouco pessoal: achei Skinamarink um porre. É uma jornada maçante que desperdiça seu enorme potencial em uma arrastada experiência que beira o insuportável. Acredito que tudo de bom que consegue atingir é reprimido por não saber a hora de acabar. O medo, a tensão e o desconforto rapidamente viraram tédio e cansaço.

Pior ainda, acredito que o auê todo que causou é inteiramente motivado por uma parte pretensiosa da comunidade de fãs de terror que acredita em conceitos fajutas como “pós-horror”/“horror elevado”, ou seja, obras de gênero que funcionam apenas em função de sua metáfora. É algo sutil o bastante para apelar para o psicológico ao invés dos sustos, e vago o suficiente para fingir que tem algo de inteligente por trás de tudo, e essa combinação costuma ser o suficiente para garantir espaço no pedestal de bastante gente. Mas escrever uma crítica a partir de tal posição reacionária seria um desserviço ao esforço do cineasta e ao gênero como todo.

A graça desse curioso exercício de linguagem é justamente fugir do lugar-comum, e provocar novas reações no espectador com algo inédito. Há sim decisões questionáveis, e a duração com certeza trabalha contra todos os acertos da obra, mas é impossível não elogiar o comprometimento de Kyle Edward Ball com sua proposta, estética e execução. Melhor ainda, é sempre digno de elogios ver um filme de terror independente e de micro-orçamento ganhando o mundo.

Ame ou odeie, Skinamarink é a prova de como o horror segue como o gênero mais interessante do cinema moderno. Novos cineastas e queridinhos cult podem simplesmente surgir do nada, com trabalhos financiados a troco de pão, e ainda assim conseguir um espaço no circuito de cinema de um país como o Brasil. O diretor - que também assina o roteiro - pode alçar uma carreira impressionante na desgraceira, visto que é raro um longa de estreia ser tão ousado e confiante em seu próprio estilo assim.

É um filme que nunca deixará de ser discutido, constantemente reinterpretado como um clássico moderno ou como lixo absoluto, e esse debate só prova que o longa conseguiu seu maior objetivo: atormentar a mente do público e da crítica como um pesadelo de infância que você não consegue esquecer.

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