O Regresso é um longa inspirado na história real de Hugh Glass, um explorador americano que servia como guia em expedições de caçadores em busca de peles de animais e foi brutalmente atacado por um urso. É um conto de sobrevivência, de traição e de vingança.
Glass, interpretado por Leonardo DiCaprio, conhece os locais de caça muito bem, assim como os perigos que existem neles. Em uma das sequências iniciais, é possível perceber isso. Nativos americanos e caçadores se confrontam em um belo plano-sequência, algo que Iñarritu mostrou que domina muito bem desde Birdman.
A cada tiro ou flecha, o foco é passado da vítima para o seu algoz, e isso continua até que mais de trinta homens do grupo de exploradores e mais outros tantos indígenas percam a vida no combate. Apesar da brutalidade da cena, o diretor consegue deixar tudo tão bem coreografado que se torna algo bonito de se ver. É um combate grotesco, sanguinário, mas os corpos caem como pecinhas de dominó.
Depois do primeiro ataque, o grupo é forçado a usar um caminho menos utilizado. Nesse momento todos ficam ainda mais vulneráveis: um único descuido e Glass é surpreendido por um urso marrom, que deixa nele feridas profundas e todos no grupo começam a desacreditar que alguém possa sobreviver a isso. E é aí que a história realmente começa.
O roteiro usa um bom tempo do filme tentando explicar através de sonhos tudo que Glass já perdeu e como ele é marcado por esse passado. No entanto, considerando que o protagonista foi praticamente mutilado e ainda está com feridas abertas e sangrando, é difícil se sensibilizar com aquelas que ocorreram muito antes. Prioridades.
O tempo é melhor utilizado mostrando as motivações de John Fitzgerald (Tom Hardy) e como ele não se importa com nenhum dos companheiros do grupo. A atuação de Hardy torna o que seria um personagem totalmente detestável em alguém mais humano.
Leonardo DiCaprio consegue passar bem as emoções em uma atuação quase totalmente silenciosa, mas que pode ser resumida em sobrevivência e vingança, enquanto Tom Hardy fica livre para entregar um personagem com um pouco mais de profundidade. Fitzgerald tem lábia, tem um objetivo e um plano que vai se adaptando conforme as circunstâncias. É difícil não simpatizar com ele.
O Regresso é muito mais uma experiência sensorial que uma história realmente interessante. A fotografia de Emmanuel Lubezki é impecável, as panorâmicas enchem os olhos, a iluminação natural valoriza cada uma das cenas, mas toda a beleza esconde mais um filme de um herói americano como tantos outros.
Os sons do ambiente, da natureza selvagem, se misturam com a trilha sonora de maneira a mostrar um ambiente belo e ao mesmo tempo opressor.
Iñarritu e outras pessoas envolvidas na produção de O Regresso focaram tanto em falar sobre a dificuldade da equipe e do elenco durante a filmagem nas locações na Argentina e no Canadá que parece que o mérito do filme é a penitência dos envolvidos e não o conteúdo em si.
Em todas as questões técnicas, o longa conseguiu ser marcante, mas para que ele fosse realmente memorável, faltou o mesmo cuidado em contar a história. Usar o fato de que foi inspirado em fatos reais não é uma desculpa plausível, já que o filme não tem intenção de ser uma biografia fiel.
Subplots como a inclusão de um filho mestiço de Glass ou de um chefe indígena que está procurando a filha parecem apenas forçados para render mais drama e minutos de filme, mas não enriquecem a narrativa, nem contribuem para o crescimento dos personagens.
A vida de Hugh Glass é inacreditável e O Regresso, com todo o seu capricho técnico, tinha todos os elementos para conseguir ser inesquecível, mas faltaram nuances para transformar o filme em algo além de uma bela pintura.