Traduzir o universo de Pokémon para as telonas era um desafio e tanto. Adaptar um mundo tão vasto e ligado a elementos cartunescos em um filme live-action como Detetive Pikachu exigiu muito cuidado e atenção aos detalhes desde sua concepção até o resultado final.
Para conseguir agradar até aos fãs mais exigentes, a Warner Bros. e a Legendary Pictures trabalharam juntamente com o Moving Picture Company (MPC), um estúdio de efeitos visuais que está no mercado há mais de 25 anos e trabalhou em projetos como o Rei Leão, Godzilla 2: Rei dos Monstros, Malévola, Shazam!, Mulher-Maravilha, Blade Runner 2049, entre outros.
Com um currículo desses, não é surpreendente que os ambientes e criaturas do longa tenham ficado incríveis, e o responsável por parte da magia que fez com que o mundo Pokémon ficasse tão vívido é Fellipe Beckman. Ele nasceu no Maranhão, mora no Canadá e trabalha na MPC como Lead Environment Generalist — ou seja, ele foi o responsável por criar os ambientes e cenário de Pokémon: Detetive Pikachu.
Beckman nos contou um pouco sobre seu trabalho e dos bastidores de produção de Detetive Pikachu, explicando seu cargo, o processo de aplicar os efeitos nas filmagens, inspirações e, claro, sobre Pokémon!
Você pode contar pra gente como é sua rotina de trabalho? Você também participa do processo de criação das artes conceituais, ou é um trabalho mais focado na pós-produção?
A rotina do Lead começa um pouco antes, bem na pré-produção dos efeitos visuais. Nessa etapa, somos responsáveis por definir a pipeline do show (filme) inteiro, quais softwares serão usados no decorrer da produção. Algumas decisões precisam ser bem concretas, pois mudar no meio do projeto pode dificultar a execução. Somos responsáveis também por fazer um orçamento de cenas, definir quantos dias serão gastos e na escolha do time.
Dependendo do seu background do Lead, também é possível atuar como concept artist, que foi o meu caso no filme. Tive a oportunidade de criar algumas coisas que infelizmente só posso citar após o filme sair dos cinemas. A produção em si começa depois que o filme já foi filmado, mas muita coisa muda no decorrer da produção, isso tudo depende da visão e mudanças de ideias do diretor, pois ele sempre tem a palavra final.

Como é o processo para aplicar os efeitos em cidades reais? Parece mais complicado quando o objeto de CG é colocado em cima de uma imagem real.
A parte bacana do processo! Nosso departamento é conhecido como 3ddmp (3D e Digital Matte Paint), a tecnologia ajuda bastante nesse processo, nosso departamento recebe os scans dos cenários reais e o processo se chama "photogrametria". Isso nos dá uma precisão maior na hora de reconstruir em computação gráfica.
Usamos também o que chamamos de image based light (IBL). O IBL é capturado durante as gravações e isso gera um arquivo com informações de luz que ajudam na hora de combinar o real com o CG. Esse arquivo nada mais é do que fotos em 360 graus do cenário, e não esquecendo o DMP, muita coisa do que se vê é pintada. O DMP é uma das técnicas mais antigas de efeitos visuais, muito usada em filmes como Star Wars mas, segundo o Wikipedia, foi usado pela primeira vez em All Quiet On The Western Front (1930). Esse recurso era usado para pintar os landscapes e hoje em dia pode ser usado para praticamente tudo.
Tanto a cidade quantos os Pokémon ficaram bem reais! Quais foram as maiores inspirações visuais?
A cidade em si é uma mistura de duas cidades que infelizmente não posso citar quais são, mas se prestar bem atenção dá pra ter uma noção das referências principais! Não tivemos envolvimento direto na criação dos Pokémon, mas o resultado final fala por si só. A intenção desde o começo foi de manter fiel ao desenho.

Você sentiu muita pressão nesse trabalho, já que Pokémon é uma das franquias mais amadas de todas?
O projeto foi bem intenso, infelizmente não posso citar detalhes técnicos, mas sim, todos tivemos uma grande responsabilidade, afinal estávamos produzindo algo para os fãs. Posso dizer por experiência própria que foi de fã para fã sem dúvidas. Trabalhar em Detetive Pikachu foi uma experiência única.
Qual a sua história com Pokémon, você já era fã da franquia?
Eu sempre fui muito fã do desenho, eu gostava de desenhar os Pokémon secretos, save? As silhuetas de "quem é esse Pokémon" que apareciam no episódios. Eu tentava memorizar e desenhar bem rápido, eu tinha coleção de desenhos e era meio que um jogo pra mim.
Eu nunca tive um Gameboy, mas tive um console da Nintendo quando era bem novo e só fui ter condição de comprar um videogame melhor (um PlayStation 2) quando estava trabalhando, mas aí era aquela coisa, não tinha tempo pra jogar (risos). Posso dizer que minha experiência mesmo com Pokémon era somente o desenho, eu não perdia um episódio sequer e hoje, tendo a oportunidade de ter colaborado com o filme, sinto que essa é uma grande conquista profissional.
Fellipe mora no Canadá, mas estará no Brasil para participar da Unhide Conference como palestrante para falar sobre sua carreira e experiências.
A Unhide Conference é um evento que reúne diversos profissionais da área de arte digital, abordando temas como direção de arte, ilustração 2D e 3D, animação, efeitos visuais, fotografia e mais. A conferência acontece nos dias 27, 28 e 29 de setembro, em São Paulo.