De vez em quando um bolo desanda. Não adianta, a pessoa escolhe os melhores ingredientes, faz com carinho, mas eis que alguém abre o forno, entra um ventinho, e pronto: a massa sola. Esse O Agente da U.N.C.L.E. tem gosto de bolo solado, um desperdício de tempo e matéria-prima. Na onda das séries de espionagem dos anos 1960, para cada Missão: Impossível que chegou muito bem repaginada ao cinema, temos um Mod Squad da vida (alguém lembra da bomba de 1999?). O Agente da U.N.C.L.E, dirigido por Guy Ritchie, entra na segunda categoria. Algo ali não deu liga — talvez seja a trama banal com elementos convenientes demais (a mocinha é filha do cientista sequestrado, sobrinha do contato da missão, mecânica de automóveis, vira espiã competente em duas cenas, e se bobear assume como técnica do Flamengo até o final da exibição); talvez seja o pé-frio do pobre Armie Hammer (O Cavaleiro Solitário — se benze, meu filho); pode ser o charme forçado do esforçado Henry Cavill (aqui mais Clark Kent do que no próprio filme do Superm-Homem, acredite). Guy Ritchie implementa o mesmo tom moderninho/modernete/modernoso (escolha aqui) que usou nos dois Sherlock Holmes com Robert Downey Jr., porém parece mais preocupado em organizar um grande ensaio de revista de moda do que filme de ação/espionagem que realmente empolgue — à luz do competentíssimo Missão: Impossível atualmente em cartaz, a comparação desfavorece O Agente da U.N.C.L.E.
E o que é então esse dinossauro? O Agente da U.N.C.L.E. foi um seriado exibido nos EUA entre 1964 e 1968, e que seria protagonizado apenas pelo agente americano Napoleon Solo (Robert Vaughn), mas a resposta dos fãs diante do personagem russo Illya Kuryakin (David McCallum) sacramentou a dupla. Solo foi criado por Ian Fleming (esse mesmo, de James Bond), que também colaborou com a premissa geral. Em plena Guerra Fria, com a CIA e a KGB uma no pescoço da outra, a agência U.N.C.L.E. agia nas brechas deixadas pelas duas. O apelo pop foi tanto que, no ano seguinte, a Marvel criou a S.H.I.E.L.D., e há indícios que Han Solo tenha herdado o sobrenome do espião da série. Os mais velhos vão se lembrar da T.I.A., a agência dos piores agentes secretos de todos os tempos, Mortadelo e Salaminho (que lutavam contra a S.O.G.R.A.).
A versão de cinema mostra a formação da dupla Solo-Kuryakin quando um cientista alemão — um desertor do nazismo que trabalhava para os EUA — é sequestrado por um casal de milionários italianos que quer realimentar a chama do fascismo de Mussolini com combustível nuclear. A contragosto, o espião da CIA e o agente da KGB se unem para desbaratar o plano, sempre desconfiando que a agência do outro tenha um interesse escuso na jogada. O Agente da U.N.C.L.E não chega a ser péssimo, é apenas tão desinteressante e vazio quanto uma revista de moda — a pessoa folheia, pula algumas páginas, e no final vê que poderia ter passado o tempo com coisa melhor.