É surpreendente que Triângulo da Tristeza tenha destaque entre os indicados ao Oscar 2023, incluindo na prestigiada categoria de Melhor Filme. A Academia de Artes e Ciências Cinematográficas é conhecida por escolher obras dramáticas, sejam intimistas ou grandiosas. A obra do sueco Ruben Ostlund (The Square: A Arte da Discórdia), por sua vez, é uma comédia sombria daquelas que você ama ou odeia, sem meio termo.
A trama segue um casal de ricos - o modelo Carl (Harris Dickinson) e a influencer Yaya (Charlbi Dean) - em um cruzeiro de luxo. Por uma combinação de fatores cada vez mais estranhos, a viagem paradisíaca se torna um pesadelo, reforçando as diferenças entre quem viaja e quem trabalha no cruzeiro.
O longa é dividido em capítulos, que acompanham a vida de Carl e Yaya antes da viagem, e depois de uma virada terrível. A parte consistente ao longo de todo o filme é a incapacidade do casal principal, ou de qualquer endinheirado ao seu redor, de compreender qualquer outra realidade que não o mundo plástico e artificial que habitam.
O fato de saber “socar para cima” e colocar a classe dominante na mira pode ser a maior explicação para o sucesso de Triângulo da Tristeza. Afinal, tanto o cinema quanto a TV vivem uma era de crítica e denúncia à desigualdade social e os excessos dos ricos, como visto em obras como White Lotus, Casamento Sangrento, Parasita e muitos outros. O filme, porém, não agrega muito à discussão, e se contenta com um comentário raso sobre o quão inabalável é a crença de superioridade da elite.

Além de Carl ser um modelo em crise, e Yaya ser uma influencer cujo conteúdo consiste apenas em selfies, o longa ainda apresenta um casal cuja fortuna é fruto da venda de armas, ou um magnata russo que cresceu às custas da exploração do Leste Europeu pós-União Soviética.
Nenhum dos personagens realmente parece ter algum talento que justifique seu poder, e ninguém parece entender qualquer aspecto da realidade além de lazer e diversão. Em certo momento, por exemplo, a esposa do magnata russo ordena que todos os funcionários deixem suas tarefas de lado para “aproveitar” um dia na piscina, mesmo que isso afete uma rotina de trabalho precisamente orquestrada.
O cineasta vê além do luxo do dinheiro, e argumenta que a elite é tão “cabeça dura” e presa no próprio mundo, que talvez nem um choque de realidade seja capaz de despertar um pouco de noção nessas pessoas. O longa coloca isso à prova, com um jantar durante uma tempestade que é facilmente a cena mais memorável - para o bem e para o mal.

Depois disso, a trama segue os sobreviventes do desastre tentando sobreviver em uma ilha. Nesse momento, o filme reforça ainda mais que tudo que faz um rico é seu dinheiro, e não algum talento ou habilidade, ao demonstrar como ninguém do grupo consegue ter a mesma capacidade para sobrevivência que a camareira Abigail (Dolly De Leon). Sem o mesmo poder de enojar ou divertir, o longa praticamente se arrasta até uma conclusão previsível.

É difícil imaginar que o filme tenha qualquer chance no Oscar, e não há realmente muito a ser apreciado aqui além de bom humor, situações cômicas e bons diálogos, mas pelo menos serve para lembrar que a Academia até pode passar a considerar obras menos dramáticas e mais subversivas, vez ou outra. E esse é um legado muito mais interessante do que qualquer coisa que o filme faz.