No começo desta semana, a discussão sobre sexismo e misoginia em Hollywood voltou a ficar aquecida. Tudo começou com a publicação de uma reportagem do New York Times que apontava que o produtor Harvey Weinstein era o responsável por três estupros e vários casos de assédio sexual.
Após o dossiê, Weinstein foi demitido da The Weinstein Co., empresa que fundou ao lado de seu irmão, Bob. Além disso, seu nome será retirado de todos os filmes e séries da produtora. Weinstein também teve sua parceria com a Disney desfeita e sua associação com a Academia Britânica de Cinema e Televisão (BAFTA) terminada. No próximo final de semana, a Academia de Ciências e Artes Cinematográficas dos EUA promoverá uma reunião entre seus membros diretores para decidir o destino do produtor.
Entenda o caso
Harvey Weinstein é um dos maiores produtores de Hollywood, fundador da Miramax em 1979 e da The Weinstein Co. em 2005. Venceu o Oscar de Melhor Filme em 1999 por Shakespeare Apaixonado e esteve por trás de longas como Gangues de Nova York, Pulp Fiction, Kill Bill 1 e 2, Cães de Aluguel e dos três O Senhor dos Anéis.
Na reportagem do New York Times, uma das vítimas, a atriz Ashley Judd (Divergente), relembrou que no começo de sua carreira o executivo marcou uma reunião com ela e na ocasião vestia apenas um roupão de banho e pediu para que ela lhe fizesse massagem e o assistisse tomando banho.
Poucos dias depois, a revista New Yorker publicou o resultado de uma segunda investigação sobre Weinstein. Nela, a atriz Asia Argento, filha do cineasta Dario Argento, relembra que o produtor se jogou por cima dela e fez sexo oral sem seu consentimento.
Eu sei que ele destruiu a vida de muita gente antes. É por isso que essa história, que no meu caso tem 20 anos, nunca veio a público.
Gwyneth Paltrow (Homem de Ferro) e Angelina Jolie (Malévola) também relataram casos de assédio por parte do executivo. Contudo, nenhuma das duas entrou em detalhes sobre o abuso. Léa Seydoux (Azul é a Cor Mais Quente) contou ao The Guardian que Weinstein tentou beijá-la a força em um quarto de hotel:
Ele é grande e gordo, eu tive que ser forte para resistir a ele.
Um áudio publicado pela New Yorker mostra o momento em que Weinstein tenta forçar a modelo Ambra Battilana Gutierrez a ir para um quarto de hotel com ele. A moça, claramente assustada, diz que não se sente confortável com a situação. Ela diz que Weinstein tocou em um de seus seios no dia anterior e o produtor só responde com um “eu estou acostumado a isso”.
Os dois artigos deixam claro que uma das cláusulas contratuais dos funcionários da The Weinstein Co. era a proibição de quaisquer críticas contra a empresa que acabassem com oportunidades de negócio ou sujassem a reputação de seus líderes. A maioria das vítimas que conversaram com o New York Times e com a New Yorker explicaram que não denunciaram os abusos por vergonha ou medo de retaliação por parte do produtor. Uma ex-funcionária que não quis ser identificada contou à revista que temia o que Weinstein poderia fazer:
Tenho medo dele arruinar minha vida se descobrisse minha identidade.
O receio de denunciar a agressão e o agressor reflete uma realidade que vai além dos corredores de Hollywood. Uma pesquisa publicada pela Cosmopolitan em 2015 mostra que 1 em cada 3 mulheres já sofreu algum tipo de assédio sexual e dessas apenas 29% denunciaram o ocorrido para as autoridades. Dentre as justificativas mais comuns estão o medo de não serem levadas a sério e o temor de represálias.
Hollywood reage
Logo depois das denúncias contra Weinstein surgirem, várias personalidades do cinema e da TV comentaram o caso. Kevin Smith, que teve uma parceria com o produtor no começo de sua carreira, disse que se sente envergonhado por ter sido financiado pelo executivo:
"Ele financiou os primeiros 14 anos da minha carreira — e agora eu sei que enquanto eu estava ganhando dinheiro, outras pessoas estavam sofrendo. Isso me faz me sentir envergonhado"
Jessica Chastain criticou a normalização da misoginia que vem sido normalizada por figuras poderosas, como o presidente Donald Trump, nos últimos anos:
"Mulheres estão lutando contra a normalização do 'agarre elas pela b*$eta' e começando a falar. Nunca é fácil ser a primeira a denunciar"
(* a frase “agarre elas pela b*$eta” foi dita por Donald Trump em 2005 em uma gravação que veio à tona durante a campanha presidencial)
Mark Ruffalo também comentou o caso e disse que espera que isso seja o pontapé inicial para o fim de situações como essa:
"Para deixar claro: o que Harvey Weinstein fez foi um abuso de poder horrível e nojento. Eu espero que isso seja o começo do fim desses abusos"
Brie Larson mostrou apoio às vítimas de Weinstein:
"Como sempre, eu fico do lado dos corajosos sobreviventes de assédio sexual e abusos. Não é culpa de vocês. Eu acredito em vocês"
Quentin Tarantino se manifestou através do Twitter da atriz Amber Tamblyn, pedindo um tempo para processar o que aconteceu antes de se manifestar:
"Na última semana eu fiquei espantado e com o coração partido com as revelações que foram feitas sobre Harvey Weinstein, meu amigo há 25 anos. Eu preciso de mais uns dias para processar minha dor, emoções, raiva e memória e então eu falarei publicamente"
Weinstein responde
Em um vídeo publicado pelo TMZ, Weinstein é abordado na saída de sua casa. Questionado pelo repórter se está bem, o produtor diz, "Eu não estou bem, eu preciso de ajuda, todos cometemos erros e eu espero uma segunda chance".
O executivo pegou seu avião particular e partiu para o Arizona para se internar em uma clínica de reabilitação.
As denúncias contra Weinstein estão sendo investigadas pelas Polícias de Nova York e Londres e um julgamento ainda não foi marcado. Segundo especialistas em direito penal consultados pelo The Guardian, o produtor pode cumprir uma pena de até 25 anos na prisão segundo as leis de Nova York.