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Crítica | Assassinato no Expresso do Oriente
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Crítica | Assassinato no Expresso do Oriente

Um filme de potencial desperdiçado

Cesar Gaglioni
Cesar Gaglioni
30.nov.17 às 15h22
Atualizado há mais de 7 anos
Crítica | Assassinato no Expresso do Oriente

A cultura pop é repleta de rivalidades que nunca vão terminar: Marvel vs. DC, Star Wars vs. Star Trek, Xbox vs. Playstation e por aí vai. Uma dessas rixas existe desde o começo do século 20, lá daqueles tempos antes do nerd ser chamado de nerd e achar isso legal: Hercule Poirot vs. Sherlock Holmes. Embora na maioria dos casos seja impossível determinar um vencedor nessas discussões, posso afirmar que caso Poirot fosse representado na batalha com a nova versão cinematográfica de Assassinato no Expresso do Oriente, o sr. Holmes ganharia com (muita) facilidade.

Dirigido e estrelado por Kenneth Branagh (o Gilderoy Lockhart, em Harry Potter), Assassinato no Expresso do Oriente adapta mais uma vez o clássico romance de Agatha Christie. Tentando passar um período de férias após muito trabalho, Hercule Poirot (Branagh) se vê envolvido em mais um mistério quando um passageiro do trem que ele estava é assassinado. Com poucas pistas ao seu dispôr, o detetive precisa encontrar o culpado — o que não será tarefa fácil, já que ali todos são suspeitos.

Com uma premissa forte baseada no livro mais famoso da escritora, o filme tinha tudo para ser uma trama policial incrível, mas o roteiro insosso faz com que o longa pareça uma aventura genérica que se estende por duas (longas) horas sem despertar nenhuma emoção no público. O primeiro problema está na construção de Poirot e dos outros passageiros que estão no trem — na maior parte do tempo, o detetive parece apenas uma caricatura excêntrica (e cheia de maneirismos) baseada no personagem criado pela autora, enquanto os outros passageiros do trem estão ali como meros coadjuvantes que servem como ponte para as deduções do investigador, sem muito desenvolvimento dramático e sem uma construção de profundidade que seria essencial para o desfecho.

Se nos romances de Agatha Christie o detetive fascina os leitores pela sua capacidade lógica de examinar pistas e ligar os pontos, aqui ele parece materializar suas conclusões de forma quase mágica, tanto que a grande revelação da trama chega a parecer forçada, como se tivesse sido criada pelos roteiristas porque eles precisavam encerrar a história de alguma forma. Isso vai além de uma mera decepção de alguém que leu a obra original — é um problema de construção de roteiro que deixa de lado um dos elementos básicos de toda história policial, que é sutilmente entregar ao espectador as peças necessárias para se desvendar o mistério que foi apresentado. Talvez alguém que nunca tenha lido o romance consiga aproveitar melhor a resolução do caso, mas quando se sabe o caminho percorrido por Poirot, o que é apresentado em tela parece enlatado.

O roteiro também tenta promover uma discussão interessante sobre a moralidade e os fundamentos da justiça ocidental, mas acaba pincelando apenas a superfície e faz com que o debate soe quase como um discurso de "a moral da história é essa daqui!", tentando escancarar seu viés para o espectador de forma (excessivamente) expositiva. O recurso de jogar todas as informações na cara do público também aparece no próprio Poirot, que de vez em quando fala sozinho para mostrar algo que possa não ter sido entendido por alguém — o que poderia ser feito de forma mais sutil, com um olhar ou uma expressão.

O elenco traz nomes de peso: Judi Dench (007), Penélope Cruz (Volver), Josh Gad (A Bela e a Fera), Leslie Odom Jr. (Hamilton), Willem Dafoe (Death Note), Michelle Pfeiffer (Mãe!) e Daisy Ridley (Star Wars). Todos entregam boas performances dentro das (muitas) limitações do roteiro, dando personalidade para cada um dos personagens e honrando suas particularidades. O destaque fica nas mãos de Josh Gad, que se distancia de seus conhecidos papéis cômicos e entrega uma atuação dramática bem executada e que dá um peso extra para a narrativa. Quando para de exagerar nos trejeitos, Branagh também dá ao público um Poirot honesto e que traz consigo elementos que consagraram o personagem de Christie: sua vaidade, o metodismo e a sutil arrogância.

Um aspecto do longa é primoroso: sua direção. Branagh sabe enquadrar suas cenas e movimentar a câmera, mostrando tudo que deve ser mostrado e criando uma atmosfera fria que contribui para o clima da narrativa. A fotografia consegue exaltar as belezas do Leste Europeu e transmitir a dimensão dos cenários. O único erro do diretor aqui é fazer um uso excessivo da lente grande angular, que acaba distorcendo partes das locações de algumas das cenas.

Ao que tudo indica, Assassinato no Expresso do Oriente é o primeiro filme de uma franquia estrelada pelo detetive. Apesar de não ter tido um bom primeiro passo, a série de longas baseados na obra de Agatha Christie pode vir a se redimir e honrar os legados da escritora e de Hercule Poirot como eles merecem.

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