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Nada de Novo no Front é intenso, apesar de pouco original | Crítica
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Nada de Novo no Front é intenso, apesar de pouco original | Crítica

Filme de guerra indicado ao Oscar é competente mesmo ao seguir por caminhos já trilhados

Arthur Eloi
Arthur Eloi
23.fev.23 às 12h09
Atualizado há mais de 1 ano
Nada de Novo no Front é intenso, apesar de pouco original | Crítica
Nada de Novo no Front/Netflix/Divulgação

Em Matadouro-Cinco, Kurt Vonnegut mistura ficção científica, humor e relatos de sua experiência na Segunda Guerra Mundial para lidar com um massacre que testemunhou na Alemanha. Como promessa às famílias dos jovens que lutaram ao seu lado, o autor explica que não tentará desvendar a razão por trás do conflito, e define: “Nada de inteligente pode ser dito sobre a guerra.

O mais próximo que uma obra do tipo chega de dizer algo inteligente é afirmar que não só a guerra é um inferno, como que também é travada por gente comum, cheia de sonhos interrompidos pelos delírios dos poderosos. Ainda que impactante, já não é um argumento novo ou original há décadas - e isso define bem o que é Nada de Novo no Front.

Em quase um século desde a publicação do livro escrito pelo veterano Erich Maria Remarque, a trama permanece a mesma: um grupo de jovens alemães é seduzido pela ação, honra e espetáculo da Primeira Guerra Mundial, mas esse otimismo vai por água abaixo quando se deparam com a violência, sujeira e os horrores inimagináveis do conflito em primeira mão.

É bom esclarecer desde já que o filme alemão do cineasta Edward Berger não tem a intenção de redescobrir algo que já não tinha sido dito, especialmente por se tratar uma nova adaptação de um dos maiores clássicos da literatura antimilitarista, originalmente publicado em 1928 - apenas uma década após o fim da Primeira Guerra Mundial. De lá para cá, essa história já serviu como base para dois filmes, sendo um deles o vencedor de Melhor Filme no Oscar de 1930.

Com uma mensagem secular sobre as atrocidades do combate armado em larga escala, o argumento central de Nada de Novo no Front já não soa mais original ou impactante, mas a produção da Netflix ainda entrega uma experiência bastante intensa.

Nada de Novo no Front é a nova versão de uma história de 1928, escrita por um veterano da Grande Guerra [Créditos: Divulgação]
O longa acompanha o jovem alemão Paul Bäumer (Felix Kammerer), que é recrutado com seus amigos para lutar pelo Eixo em território francês. Não demora nada para o filme imergir o espectador no lamaçal decadente das trincheiras durante os anos finais do conflito. A inocência do rapaz é arrancada ao primeiro tiro de metralhadora, e é nesses momentos que Nada de Novo no Front sabe como partir o coração de seus espectadores.

Logo na abertura, o cineasta evidencia a banalidade da vida humana no conflito ao seguir o trajeto de um uniforme que é recolhido de sua vítima, levado para a limpeza, costurado e então entregue para outro jovem que também deve ter o mesmo destino.

A direção de Berger também não traz nada de particularmente impressionante ou inventivo, na contramão de exemplos recentes como 1917(2019). Mas o cineasta entende que o foco da jornada é o olhar de Paul, e sempre destaca a feição cada vez mais moribunda do jovem soldado ao ritmo que enfrenta decepção atrás de decepção.

Ainda que seja um filme explosivo, os momentos mais profundos de Nada de Novo no Front são as pequenas tragédias que varrem o campo de batalha, como o protagonista ser forçado a roubar animais de fazendeiros locais para se manter alimentado, ou então ver seus amigos morrendo sem grandes cerimônias, ou desertando.

Enquanto no início, o rapaz e seus colegas estão na escola, e não parecem ter mais do que 15 ou 16 anos, celebrando o recrutamento ao exército como se fosse uma viagem escolar para um parque de diversões, minutos depois, ao enfim encararem a violência da Terra de Ninguém, eles estão chorando por suas mães.

O momento mais devastador mesmo é quando o choro para, e os que sobrevivem se vêem marcados por semblantes pálidos, fantasmagóricos ou então à beira da insanidade. Como diria Vonnegut em seu bordão sobre “aceitar” os absurdos incompreensíveis da guerra para não surtar: é assim mesmo.

A experiência é um pouco mais violenta que a média dos filmes de guerra, ao rejeitar qualquer noção de heroísmo que poderia surgir nesta situação. Não há nada de glorioso em jovens sendo mandados para suas mortes, por decisões tomadas por homens velhos em salas confortáveis. Ainda assim, Nada de Novo no Front tenta equilibrar o choque com o espetáculo.

Maior destaque de Nada de Novo no Front é sua excelente produção, que transmite a imundice das trincheiras com muita textura [Créditos: Divulgação]
Mesmo com uma temática pesada e complexa, o longa é marcado por diversas cenas de ação e combate que são sim empolgantes, mas também um pouco contraditórias à mensagem central. Por um lado, é preciso admirar o enorme talento de todos os envolvidos na produção: são poucos os filmes de guerra que realmente transmitem o frio, a paranoia dos sobreviventes e o lamaçal imperdoável das trincheiras. Tudo é repleto de textura, que tornam a experiência mais imersiva e amedrontadora.

Por outro lado, parece que o longa evita criar algo realmente reflexivo. Há poucos momentos de silêncio, e o filme tenta correr atrás do prejuízo ao apelar para a violência gráfica - que, por sinal, é muito bem executada. É natural que uma obra de guerra queira chocar pelo visual, mas o desequilíbrio entre impactar o estômago e impactar a mente impedem que Nada de Novo no Front chegue à altura de algo como Vá e Veja (1985), conhecido como um dos filmes de guerra mais pesados da história.

Adaptando uma história tão antiga, que já serviu de inspiração para o gênero de guerra como um todo, o novo longa teria que se esforçar muito mais para fugir de um lugar-comum. Não foi o caso, mas não é sinal de que é uma produção preguiçosa. Muito pelo contrário, o filme conquista pelo visual e pela brutalidade. Sua mensagem já é amplamente entendida, e a empolgação da ação pode até soar um pouco contraditória, mas é sempre bom o lembrete da intensa realidade da guerra.

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