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Far Cry 6 | Review
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Far Cry 6 | Review

Uma aventura mais honesta e autêntica que os últimos jogos da franquia

Bruno Silva
Bruno Silva
06.out.21 às 08h00
Atualizado há mais de 3 anos
Far Cry 6 | Review

Os primeiros segundos da apresentação de Far Cry 6 trazem um lado surpreendente da franquia da Ubisoft. Com uma estética digna de filme de James Bond, a abertura vai traçando a história de seu cenário, o país de Yara, cujas raízes se espelham nas origens de Cuba como nação, da invasão dos colonizadores espanhóis até a revolução que levou a mais de meio século da família Castro no poder.

Nos últimos anos, a Ubisoft têm gostado da ideia de utilizar de alegorias ideológicas para estabelecer o tema do Far Cry e com ele, a liberdade de tocar o terror pelo mapa da maneira que quiser. Mas eu não esperava ver algum tipo de reflexão minimamente profunda sobre os temas nos quais o jogo se debruça, ao trazer um lado pouco debatido quando se fala da Revolução Cubana hoje em dia: o de um movimento que se levantou contra o imperialismo.

Embora não seja o tema principal do game, que ganhou fama ao explorar a crueldade excêntrica de seus vilões, fui observando, pouco a pouco, como esses comentários iam surgindo em uma linha de diálogo ali, outra aqui, em meio à luta revolucionária dos guerrilheiros da Libertad para livrar Yara de outro tirano: Antón Castillo (Giancarlo Esposito).

Não é algo que esperava de uma franquia que, talvez, tenha atingido em Far Cry 5 o ápice do paradoxo de trazer um tema altamente político e não saber o que fazer com ele. Em uma época em que soa cada vez pior dizer que jogos sobre guerra “não são políticos”, a Ubisoft se aprofunda ao jogar a discussão dos temas para o desenvolvimento de seus personagens e o resultado é positivo - ainda que essa profundidade tenha passado do nível de um pires para o de um copo americano. É pouco, mas é progresso.

El Presidente

Far Cry 6 tem em seu coração a ideia de colocar o jogador no centro de uma guerrilha, o que explica o motivo de a Ubisoft ter ido buscar inspiração no país que foi palco de um dos movimentos guerrilheiros mais famosos do século XX. Mas essa história é acompanhada de um “e se” digno de século XXI.

No game, Antón Castillo é eleito após mais de cinquenta anos do governo nascido de uma revolução em 1967 que libertou o país da tirania do pai dele, mas resultou em um bloqueio econômico que fez o local se isolar e parar no tempo.

Castillo volta com força popular e econômica: no centro de sua plataforma de governo está a fabricação de um remédio chamado Viviro, extraído das plantas de tabaco yarenses, que se prova ser o mais eficaz tratamento de câncer do planeta. A fabricação da droga, no entanto, requer o manuseio de agrotóxicos letais. A solução de Castillo? Transformar as plantações de tabaco em campos de trabalho forçado, para onde são enviados os opositores de seu regime.

No meio disso tudo, você é Dani Rojas, uma jovem (ou um jovem, a escolha é sua) que foi expulso do exército yarense e deseja se refugiar nos Estados Unidos. Os planos dão errado e você acaba caindo no colo da Libertad, uma guerrilha composta por jovens que deseja derrubar Castillo.

Dani Rojas, protagonista de Far Cry 6 Dani Rojas, protagonista de Far Cry 6

Relutante em se juntar ao grupo, Dani vai pagando sua “dívida” ao ser acolhida pela guerrilha enquanto conhece melhor as motivações dos correspondentes a Fidel e Che: Clara García, a jovem e inspiradora líder do movimento, e Juan Cortez, ex-espião e mestre nas técnicas de guerrilha que se torna uma espécie de “mentor” da protagonista.

A preocupação em desenvolver os personagens é algo incomum na franquia, que normalmente se dedica mais aos vilões e costuma esquecer um pouco os protagonistas. Mas a mudança aqui é bem-vinda.

Pela primeira vez desde Far Cry 3 - justamente o último a dar um pouco de personalidade a seu herói e o primeiro a lançar essa tendência de antagonistas dominantes com Vaas - eu me vi investido tanto na história de Dani, Clara e os guerrilheiros da Libertad, quanto o desenrolar sádico das ações de Castillo.

Inclusive, quem acaba perdendo um pouco nessa história acaba sendo o próprio vilão. Quase sempre quando entra em cena, Castillo parece fazer uma performance teatral, cheia de discursos ensaiados e ações dramáticas que, no mínimo, desperdiçam a sutileza do potencial de atuação de Giancarlo Esposito, que se provou ser um exímio intérprete de antagonistas desde o Gus Fring de Breaking Bad.

Quem acaba adicionando o tempero à história dos Castillo é um outro personagem: Diego, o filho adolescente do ditador que é carregado a tiracolo por ele no decorrer do jogo, em uma tentativa do pai de ensiná-lo a governar Yara com mão forte. Tal qual Dani, Diego também exibe relutância em trilhar o caminho apresentado por Antón, e a transformação dessa dinâmica é um ponto interessante de acompanhar na história, ainda que aconteça de forma isolada por boa parte do game.

Toda essa profundidade narrativa só é possível por uma escolha criativa muito acertada da Ubisoft: colocar todas as cenas com diálogos marcantes em uma perspectiva de terceira pessoa, relegando a câmera de FPS apenas para os momentos de gameplay. Parece simples, mas é algo que facilita muito o desenvolvimento da personalidade de Dani, descolando as motivações da personagem das suas ações.

Construindo a Revolução

No fim, as mudanças mais profundas de Far Cry 6 acabam acontecendo na parte narrativa, já que os segmentos interativos e as estruturas de jogo foram pouco alteradas em relação aos demais games da franquia. Isso, por si só, já é um testamento do quão robusta é a fórmula de Far Cry, que retém uma identidade própria, mesmo mudando tão pouco e tendo tanto em comum com outros títulos da Ubisoft.

Tal qual a maioria dos games de mundo aberto da empresa atualmente, Far Cry 6 se divide em três grandes áreas que precisam ser liberadas da influência tirânica de Castillo, reforçada por seus “tenentes”, cada um representando um dos lados do tripé que sustenta o lucrativo negócio do Viviro.

Sendo assim, cada naco de mapa tem seu arco narrativo próprio, e cada área é dividida em territórios menores. Do jogo mais recente da série, Far Cry: New Dawn, vêm um sistema de nível de personagem que serve para direcionar a progressão da história, já que os territórios também têm níveis e estes vão aumentando à medida que o regime de Castillo é ameaçado. Felizmente, os graus de dificuldade não são tão rígidos, permitindo que você se aventure por locais mais perigosos com uma certa liberdade.

No melhor estilo da guerrilha, a progressão do personagem também é feita na base da gambiarra: além dos habituais recursos coletáveis que podem ser usados para modificar armas, a grande novidade está no Supremo, uma mochila customizável que dá um poder especial ao protagonista, desde uma saraivada de foguetes até a capacidade de tomar impulso em pleno ar com um jetpack improvisado.

De outras experiências recentes da Ubisoft, vêm uma preocupação em desinchar o mapa de ícones, colocando o jogador para encontrar pontos de interesse na base da descoberta, seja por documentos escondidos, seja por conversas valiosas com guerrilheiros pelas matas yarenses.

Far Cry 6 tem uma infinidade de atividades no mapa, que vão do desenvolvimento de acampamentos e caçada de tesouros a um minigame de rinha de galo na pegada de Street Fighter que eu não esperava funcionar tão bem. Mas, ao mesmo tempo, o foco está na liberdade de agir que sempre pautou a franquia, e cujo estilo caótico é favorecido pela estrutura de jogo oferecida.

Chorizo, o cãopanheiro com rodinhas em Far Cry 6 Chorizo, o cãopanheiro com rodinhas em Far Cry 6

Também não podemos deixar de falar dos companheiros de exploração do protagonista, que já viraram marca registrada da série e retornam com representantes que vão do cômico ao adorável, como o crocodilo Guapo, que usa uma camiseta, ou o adorável Chorizo, um cachorro salsichinha que anda de rodinhas nas patas traseiras.

Buena Vista

Far Cry 6 é o primeiro jogo da série a ser lançado para PlayStation 5 e Xbox Series X|S, mas, assim como boa parte dos games lançados no início de uma nova geração de consoles, os saltos técnicos destas plataformas não devem ser sentidos logo de cara.

Testamos o título em um PC de configuração próxima a de um PS5 e Xbox Series, com o game sempre em 60fps e com ray tracing ativado e, embora o resultado seja impressionante — e realçado pela direção de arte, no belíssimo cenário paradisíaco da ilha tropical de Yara —, não é algo tão diferente de um Assassin’s Creed Valhalla ou lançamento recente da empresa.

Por outro lado, o jogo também teve uma performance estável, com alguns poucos crashes e quase nenhum bug significativo durante a aventura. É claro que sempre há a possibilidade de glitches serem descobertos quando o game estiver nas mãos dos jogadores, mas, a princípio, a experiência não parece ser comprometida por eles, ao menos quando roda nas configurações recomendadas.

Vale ressaltar também o cuidado do jogo com a acessibilidade, que, seguindo o exemplo de outros jogos de alto orçamento como The Last of Us: Parte II, traz diversos auxílios para pessoas com deficiência visual e/ou auditiva.

Revolução conservadora

Apesar de falar sobre revolução, Far Cry é talvez o título mais conservador da Ubisoft. Em meio a um momento em que a produtora passa por um intenso processo de autocrítica na concepção de seus jogos, especialmente os de mundo aberto, ele traz sim, na maior parte do tempo, um quê de “mais do mesmo”, o que faz com que as pequenas mudanças pareçam ainda mais significativas.

A decisiva mudança de perspectiva para a terceira pessoa durante as cutscenes aliada a um texto que se permite desenvolver um pouco melhor os temas alardeados pela propaganda fazem de Far Cry 6, acima de tudo, uma aventura mais honesta e autêntica que os últimos games da franquia. Não é algo que a maioria dos jogadores, mais interessados em atirar, pular, correr e pilotar, vão buscar em um título como esse, mas a camada extra de profundidade é bem-vinda.


Far Cry 6 será lançado no dia 7 de outubro para PC, PlayStation 4, PlayStation 5, Xbox One, Xbox Series X|S, Stadia e Luna. Este review foi feito com uma cópia de PC cedida pela Ubisoft.

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